Na hora do toque
O toque é a forma mais comum de verificação da verdade. Usa-se o toque na
Medicina, na Agricultura, na joalharia – onde é tão conhecida a função da pedra
de toque – e praticamente em todas as actividades humanas. Foi pelo toque dos
dedos nas chagas que Tomé reconheceu
a legitimidade da aparição de Jesus ressuscitado. No Espiritismo a pedra de
toque é a obra de Kardec.
Mas porque essa obra e não outra? É bom que se deixe bem
esclarecido esse porquê, pois há muitas pessoas que não entendem a razão disso
e acham que se dá preferência a Allan Kardec por
motivos emocionais e até por fanatismo. Vamos tentar esclarecer o assunto da
maneira mais rápida e racional.
1º – A obra de Kardec não é pessoal, não é só dele. Era
preciso alguém responder pela obra. O Professor Denizard Rivail,
como se sabe, resolveu assumir essa responsabilidade e assinou-a com um
pseudónimo: Allan Kardec, nome que havia possuído em encarnação anterior,
quando sacerdote druida, entre os celtas. A obra é dos Espíritos
Superiores da luminosa falange do Consolador ou Espírito de
Verdade, que Jesus prometeu enviar à Terra quando os homens estivessem aptos
para compreender a sua doutrina em essência. Por isso Kardec deu ao livro
básico da doutrina o título de O Livro dos Espíritos e à
própria doutrina o nome de Espiritismo. Por isso também os demais
livros da Codificação trazem como subtítulo esta expressão: Segundo o
Espiritismo, ou seja, de acordo com a Doutrina dos Espíritos.
A doutrina, portanto, não é de Kardec, mas dos
Espíritos Superiores que a revelaram a Kardec. Não obstante, Kardec fez a sua
parte, quer através das perguntas que fazia aos Espíritos, quer através dos
comentários explicativos que escreveu em todos esses livros. Esses comentários
foram sempre submetidos por Kardec ao exame dos Espíritos, que os aprovavam ou
emendavam. Kardec submetia tudo ao exame da razão, realizando um trabalho de
cerca de quinze anos, sempre assistido pelos
Espíritos Superiores dirigidos pelo Espírito de Verdade.
2º – Desde 1857, quando foi publicado O Livro dos
Espíritos, até hoje, nenhum dos princípios do Espiritismo foi desmentido
pela Ciência ou pela Filosofia. Pelo contrário, todos eles têm sido
sistematicamente confirmados por ambas. Quanto à Religião, nunca teve condições
para contradizer o Espiritismo de maneira positiva, tentando sempre fazê-lo de
maneira autoritária ou dogmática, sempre no interesse particular dos princípios
de cada seita.
Hoje o avanço das Ciências e da Filosofia confirma de
maneira inegável e impressionante a legitimidade da Doutrina Espírita. As
descobertas mais recentes da Parapsicologia, da Física e da Biologia nada mais
fazem do que comprovar a verdade dos princípios espíritas, sem
que os investigadores tivessem essa intenção. Até mesmo quando pensam haver
negado o Espiritismo, os investigadores, sem o saber, o estão comprovando. Isso
prova a solidez da obra de Kardec.
3º – A Bíblia, livro religioso dos judeus, anunciou a
vinda de Jesus. Os Evangelhos, que formam o livro religioso do
Cristianismo, anunciaram a vinda do Espírito de Verdade. Os
Espíritos Superiores que hoje se manifestam são unânimes em afirmar que Kardec
foi o discípulo de Jesus enviado à Terra para realizar a
codificação do Espiritismo, doutrina que representa a continuação histórica do
Cristianismo e restabelece os ensinos de Cristo em espírito e verdade.
As reformas religiosas por que passam hoje as Igrejas
estão-se processando de acordo com a orientação dada pelos
princípios espíritas. As próprias pesquisas da Astronáutica, a ciência mais
audaciosa do nosso tempo, estão confirmando o que os Espíritos
disseram a Kardec sobre os mundos do Espaço, a infinitude do Universo, a
inexistência do vácuo, a variedade infinita das formas da matéria e assim por
diante.
4º – Quanto mais avança o conhecimento, mais se vão
descobrindo as relações da obra de Allan Kardec com
as alegorias e simbologias religiosas da chamada Sabedoria
Antiga, das mais velhas religiões da Índia, da China, do Egipto, da Babilónia e
assim por diante. Com tudo isso, o Espiritismo se confirma dia a dia como a
doutrina do futuro. Ainda há pouco os jornais e revistas do mundo inteiro noticiaram que
os cientistas soviéticos, os mais materialistas do mundo, se viram obrigados a
discutir a obra de Kardec num grande simpósio científico realizado na Rússia, e
isso em virtude das recentes descobertas realizadas por eles na investigação da
Física e da Biologia, com referência à antimatéria e ao corpo
energético do homem, ou corpo bioplasmático, que na verdade confirma a
teoria do perispírito ou corpo semimaterial do homem, que é um dos princípios
fundamentais do Espiritismo. Nenhuma outra doutrina, em todo o mundo, tem
recebido tão ampla e decisiva confirmação das pesquisas científicas modernas.
5º – No campo da Filosofia passa-se a mesma coisa. A
corrente filosófica que caracteriza o nosso século, a das chamadas Filosofias
da Existência, não obstante as suas diversas ramificações, confirma no
geral a teoria espírita da natureza transcendente do homem. E por outro lado
seguem o caminho do Espiritismo no estudo e na investigação da natureza humana,
partindo do homem na existência para chegar à compreensão
progressiva dessa natureza. Tudo converge, no pensamento actual, para a
comprovação da legitimidade da obra de Allan Kardec.
Diante desse panorama positivo, qualquer obra que pretenda
superar Allan Kardec ou
subestimar a Doutrina Espírita precisa ser submetida à prova do toque. E essa
prova só pode ser feita de duas maneiras: de um lado, conferindo-se a pretensa
superação com a obra de Kardec para verificar qual das duas está mais coerente
e apresenta maior coesão, maior unidade e firmeza nos seus princípios; de outro
lado, conferindo-se, como recomenda o próprio Kardec, os princípios da pretensa
superação com as exigências do pensamento actual em todos os campos da nossa
actividade mental.
A obra de Kardec tornou-se, após um século de sua negação e
rejeição pelos adversários, a pedra de toque da legitimidade
das novas obras e novas teorias que vão surgindo no mundo. É por isso que essa
obra – a obra de Kardec – nos oferece os elementos necessários a uma crítica
válida e a uma apreciação verdadeira das novas doutrinas que pretendem
modificá-la ou superá-la. Se alguém nos apresentar outra obra em melhores
condições do que essa, para servir de pedra de toque, estaremos prontos a
trocar a pedra. Mas enquanto a obra de Kardec continuar nessa posição, não
temos razão para substituí-la.
Convém lembrar ainda este ponto importante: a falência total
ou parcial da obra de Kardec representará a falência total ou parcial dos
Espíritos Superiores, particularmente do Espírito de Verdade, e
consequentemente a falência dos ensinos de Cristo.
Isso não quer dizer que o Espiritismo seja uma doutrina
cristalizada, incapaz de evoluir e se desenvolver. Quer dizer apenas que o
Espiritismo realizou o toque da verdade na cultura humana, tocou
nos pontos essenciais da comprovação da realidade universal pelo homem. Os seus
princípios fundamentais são realmente inabaláveis, mas estão sujeitos a
desenvolvimentos que se darão de acordo com a evolução do homem, que progride
sem cessar e aumenta constantemente a sua capacidade de compreender melhor a
natureza humana, o mundo e a vida.
/…
José Herculano Pires – A Pedra e o Joio, Crítica à Teoria
Corpuscular do Espírito, Na hora do toque, 2º fragmento da obra.
(imagem de ilustração: As Colhedoras de Grãos,
pintura a óleo por Jean-François
Millet)
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