quarta-feira, 22 de junho de 2022

Saberes e o tempo ~


Capítulo III 

O mundo espiritual e os fluidos; A energia e os fluidos ~

Até há pouco, a Ciência negava a existência de estados imponderáveis da matéria e a hipótese do éter estava longe de ser unanimemente admitida, apesar da sua necessidade para tornar compreensíveis os diversos modos da força. Actualmente, já a negação não será talvez tão absoluta, pois que toda uma categoria de novos fenómenos veio mostrar a matéria revestida de propriedades de que nem se suspeitava. 

A matéria radiante dos tubos de William Crookes revela as energias intensas que parecem inerentes às últimas partículas da substância. Os raios X, que nascem no ponto em que os raios catódicos tocam o vidro da ampola, ainda mais singulares são, porquanto se propagam através de quase todos os corpos e têm propriedades fotogénicas, sem serem visíveis de si mesmos. Finalmente, as experiências espíritas de Wallace, de Beattie, de Aksakof consignam, fotografados, esses estados da matéria invisível, que concorrem para a produção dos fenómenos espíritas. 

Dr. Baraduc, o comandante Darget, o Dr. Adam, o Dr. Luys, o Sr. David e as experiências do Sr. Russel (i) põem de manifesto essas forças materiais que emanam constantemente de todos os corpos, mas, sobretudo, dos corpos vivos e, os clichés que se obtêm são testemunhos irrecusáveis da existência desses fluidos. (ii) 

Assistimos, presentemente, à demonstração científica desses estados imponderáveis da matéria antes tão obstinadamente repelidos. Mais uma vez, se confirma o ensino dos Espíritos, sendo a prova de veracidade das suas revelações dada por pesquisadores que não partilham das nossas ideias e que, portanto, não se podem suspeitar de complacências. 

É necessário que o público, ao ouvir-nos falar de fluidos, se habitue a não ver nessa expressão um termo vago, destinado a mascarar a nossa ignorância. É necessário fique ele bem persuadido de que estamos constantemente mergulhados numa atmosfera invisível, intangível pelos nossos sentidos, porém, tão real, tão existente, quanto o próprio ar. 

Não é certo que as maiores inteligências do século, os mais hábeis analistas, químicos e físicos hão vivido em contacto com o árgon, o novo gás que faz parte integrante do ar, sem lhe suspeitarem a presença? Esse exemplo deve inspirar modéstia a todos quantos orgulhosamente proclamam que sabem todas as coisas e que a Natureza nenhum mistério já lhes guarda. A verdade é que ainda somos muito ignorantes e que a nossa existência se escoa num lugar do qual só pequeníssima parte conhecemos. 

O de que todos se devem bem compenetrar é de que a atmosfera que nos circunda contém seres e forças cuja presença normal somos incapazes de apreciar. O ar se encontra povoado de miríades de organismos vivos, infinitamente pequenos, que não lhe turvam a transparência. No azul translúcido de um belo dia de verão volteia uma inumerável quantidade de sementes vegetais, que irão fecundar as flores. Ao mesmo tempo, o espaço se encontra atravancado de biliões de seres, aos quais foi dado o nome de micróbios. 

Todos esses seres evolvem dentro de gases cuja existência nada nos revela. O ácido carbónico, produzido por tudo o que tem vida ou se consome, mistura-se aos gases constitutivos do ar, sem que alguém o possa suspeitar. Quase todos os corpos emitem vapores que imergem nesse laboratório límpido e os nossos olhos permanecem cegos para todos esses corpos tão diversos, cada um com a sua função e a sua utilidade. 

Tampouco os nossos sentidos nos advertem dessas correntes que sulcam o globo e desorientam a bússola durante as tempestades magnéticas. Só raramente a electricidade se manifesta sob forma que nos seja apreciável. Ela não existe unicamente no instante em que o raio risca a nuvem, em que repercutem ao longe os roncos do trovão; antes, actua perpetuamente, por meio de lentas descargas, por meio de trocas incessantes entre todos os corpos de temperaturas diferentes. A própria luz não a percebemos, senão dentro de limites muito acanhados. Os seus raios químicos, de acção tão intensa, escapam completamente à nossa visão. 

Somos banhados, penetrados por todos esses eflúvios no meio dos quais nos movemos e longuíssimo tempo viveu a humanidade sem conhecer tais factos que, entretanto, sempre existiram. Foram necessárias todas as descobertas da ciência, para criarmos sentidos novos, mais poderosos, mais delicados do que os que devemos à Natureza. O microscópio nos revelou o átomo vivo, o infinitamente pequeno; a chapa fotográfica é, ao mesmo tempo, um tacto e uma retina, de incomparáveis finura e acuidade de visão. 

O colódio regista as vibrações etéreas que nos chegam dos planetas invisíveis, perdidos nas profundezas do espaço e, nos revela a existência deles. Apanha os movimentos prodigiosamente rápidos da matéria quintessenciada; reproduz fielmente a luz obscura que todos os corpos à noite irradiam. Se a nossa retina possuísse essa singular sensibilidade, seríamos impressionados pelas ondas ultravioletas, como o somos pela parte visível do espectro. 

Pois bem! essa chapa preciosa ainda nos presta o serviço de dar a conhecer os fluidos que emanam do nosso organismo, ou que nele penetram. Mostra-nos, com irresistível certeza, que em torno de nós forças existem, isto é, movimentos da matéria subtil, que se diferençam uns dos outros pelos seus caracteres particulares, por uma assinatura especial. Presentemente, já não se pode duvidar dessas modalidades, desses avatares da matéria. 

Há, envolvendo-nos, uma atmosfera fluídica incorporada na atmosfera gasosa, penetrando-a de todos os lados. São ininterruptas as suas acções: é todo um mundo tão variado, tão diverso nas suas manifestações, quanto o é a natureza física, isto é, a matéria visível e ponderável. Há fluidos grosseiros, como fluidos quintessenciados, uns e outros com propriedades inerentes ao respectivo estado vibratório e molecular, que os tornam substâncias tão distintas, quanto o podem ser, para nós, os corpos sólidos ou gasosos. 

Mas, que energias se manifestam nesse meio! Que de mudanças visíveis, de mobilidade, de plasticidade nessa matéria subtil! Quanto ela difere da pesada, compacta e rígida substância que conhecemos. A electricidade nos permite julgar da instantaneidade das suas transformações: é um prodígio, uma febre contínua. É bem a fluidez ideal para as tão leves, tão vaporosas, tão instáveis criações do pensamento. É a matéria do sonho, na sua impalpável realidade. 

Estudando a matéria gasosa, chegamos a imaginar esses estados transcendentes. Já, sob a forma radiante, vemos os átomos, movendo-se com velocidades fantásticas, produzirem fenómenos cuja intensidade, dada a massa de matéria posta em jogo, é realmente formidável e essa energia nos faz compreender a força, nas suas manifestações superiores de luz, electricidade, magnetismo, devidas às rapidíssimas ondulações do éter. 

Torna-se admissível que esses átomos animados de enormes velocidades rectilíneas, girando sobre si mesmos com vertiginosa rapidez, desenvolvam uma força centrífuga que anula a atracção terrestre. Sim, é mais que provável que eles se diferenciem entre si pela quantidade de força viva que individualmente contêm e podemos entrever a inesgotável variedade de agrupamentos que se constituem entre essas inúmeras formas de substâncias. 

É o mundo espiritual, o que nos cerca e penetra, no qual vivemos. Com ele entramos em relações por meio do nosso organismo fluídico. Porque possuímos um perispírito, possível se nos faz actuar sobre esse mundo invisível à carne. É pela nossa constituição espiritual que os Espíritos têm acção sobre nós e nos podem influenciar. 

/… 
(i) Veja-se a Revue Scientifique et Morale du Spiritisme, 2º ano, número de julho de 1897 e, números de maio, junho e julho de 1898. 
(ii) Revue Scientifique, de 25 de dezembro de 1897, Influência dos metais sobre a chapa fotográfica, à distância e na obscuridade. 


Gabriel Delanne, A Alma é Imortal, Terceira parte – O Espiritismo e a ciência; Capítulo III – O mundo espiritual e os fluidos; A energia e os fluidos, 11º fragmento desta obra. 
(imagem de contextualização: Pitágoras, pormenor d'A escola de Atenas de Rafael Sanzio (1509)

segunda-feira, 13 de junho de 2022

apóstolos de verdade ~


Apresentação ~
(Herculano Pires por Jorge Rizzini) 

Laureado pela Academia Brasileira de Letras e pela Câmara Brasileira do Livro, Caio Porfírio Carneiro (escritor sem vínculo com o Espiritismo) publicou no jornal “Linguagem Viva”, edição de outubro de 2000, uma crónica sobre Herculano Pires, da qual extraio os seguintes tópicos que retractam o mestre: 

“Parece que estou a ver Herculano Pires sentado no bar, em frente ao prédio dos Diários Associados, na Rua 7 de Abril, aqui em São Paulo, onde trabalhava, naquela tarde ensolarada, cercado de amigos, bebendo qualquer coisa, creio que nada alcoólico e, respondendo a nossas perguntas curiosas sobre Espiritismo. Era ele um estudioso e devoto da doutrina, kardecista famoso, convidado anualmente pela direcção do Bradesco para a festa na Cidade de Deus, criação do presidente do Banco, Amador Aguiar, para os funcionários. Era e sempre foi uma festa belíssima do dia de acção de Graças. Compareciam representantes de destaque das mais diversas religiões cristãs. O único que representava uma corrente espiritual não religiosa era Herculano Pires. Quando chegava a sua vez de falar e abria o verbo, encantava a todos. (...) Tipo mais ou menos gordo, estatura mediana, óculos, andar meio bamboleante, rosto cheio, corado, irradiava uma simpatia pessoal muito grande. (...) Não externava a sua cultura, a sua vasta leitura em praticamente todos os campos do conhecimento. Criatura modesta, cavalheiro de primeira linha, simples por natureza. Apenas quando soltava o verbo, como nas festas da Cidade de Deus, o vulcão vinha ao vivo, mostrava-se fulgurante, brilhante, dono de uma inteligência privilegiada.” 

Observações precisas, as de Caio Porfírio Carneiro

José Herculano Pires foi o que podemos chamar homem múltiplo. Em todas as áreas do conhecimento em que desenvolveu actividades – dentro e fora do movimento doutrinário – a sua inteligência superior iluminada pela Doutrina Espírita e pela cultura humanística brilhava com grande magnitude, fazendo o povo crescer espiritualmente. 

Herculano Pires foi mestre em Filosofia da Educação na Faculdade de Filosofia de Araraquara e membro da Sociedade Brasileira de Filosofia. Presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo e fundador do Clube dos Jornalistas Espíritas de São Paulo, que presidiu por longos anos. Director da União Brasileira de Escritores e vice-presidente do Sindicato dos Escritores de São Paulo. Presidente do Instituto Paulista de Parapsicologia. Romancista, recebeu em São Paulo o “Prémio Municipal de Cultura” e foi reconhecido pela crítica como um dos renovadores do romance brasileiro. 

E, o que é mais importante: espírita desde os vinte e dois anos de idade, ninguém no Brasil e no estrangeiro mergulhou tão fundo nas águas cristalinas da Codificação Kardeciana e ninguém defendeu mais – e com mais competência do que ele – a pureza doutrinária, que colocava acima das instituições e dos homens, de que é exemplo a batalha dantesca que travou quando uma edição adulterada de trinta mil exemplares de O Evangelho Segundo o Espiritismo fora publicada por uma das maiores federações espíritas do Brasil. 

“Todo o espírita consciente de suas responsabilidades humanas e doutrinárias está no dever intransferível de lutar contra essas ondas de poluição espiritual que pesam na atmosfera terrena. Ninguém tem o direito de cruzar os braços em nome de uma falsa tolerância que os levará à cumplicidade”, declarou o mestre. (1) 

Para comer o pão da verdade só necessitamos dos dentes do bom-senso, dizia ele. 

Herculano Pires, desde o ano da conversão ao Espiritismo ao de sua desencarnação, ou seja, durante quarenta e três anos ininterruptos, ampliou superlativamente a cultura espírita, propagou e defendeu os princípios doutrinários na Rádio, na TV, nos jornais, no livro e na tribuna. Ele foi o fermento de que nos fala o Evangelho. E, notemos, foi imbatível esse apóstolo de Allan Kardec! As suas principais batalhas doutrinárias estão relatadas nesta biografia com absoluta fidelidade, pois além de testemunhá-las, participei de algumas e seu vasto acervo doutrinário, incluindo o diário íntimo, (2) me fora cedido pela esposa. 

Reencontrei Herculano Pires nesta existência no ano de 1952 na cidade de São Paulo, na tradicional Livraria Teixeira – ponto de encontro de escritores e poetas. Tinha eu vinte e oito anos de idade e ele trinta e oito. É curioso: reencarnamos no dia 25 de setembro. Ele em 1914, durante a primeira grande guerra, e eu dez anos depois, durante a revolução de 1924. Mas a nossa amizade tem raízes em vidas anteriores – desde o tempo de Roma Imperial. Quando as nossas vozes eram ouvidas no senado romano trabalhamos secretamente em favor do triunfo das ideias revolucionárias de Cristo. E, como toquei agora em assunto tão delicado que, certamente, despertará a curiosidade dos leitores, convido-os a ler o trecho de uma conversa de Herculano Pires comigo e por mim gravada em 1972, trecho que somente hoje dou à publicidade, no qual relata ele uma encarnação sua no século XIX (ao tempo de Allan Kardec), quando foi eminente historiador, romancista e poeta português.  

O referido trecho do saudoso companheiro de batalhas espirituais encontra-se no fim deste volume. 

São Paulo, 1º de Dezembro de 2000. 

Jorge Rizzini 

~~*~

Apêndice 

Herculano Pires revela uma sua encarnação 

Na noite de 14 de julho de 1972 gravei em fita magnética a conversa que mantive com Herculano Pires no seu lar após os trabalhos mediúnicos. Trata-se de uma entrevista longa e informal, improvisada, durante a qual ele revelou uma sua encarnação. Eu lhe havia prometido que somente a divulgaria após a sua passagem para o Grande Além. Eis o trecho em questão: (3) 

(Rizzini) – Suponhamos que você, Herculano, estivesse vivendo no século XIX na França e visse nas livrarias de Paris O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, lançado nesse dia nas livrarias. Qual a sua impressão após a leitura da obra? 

(Herculano) – Jorge Rizzini, você me dá a oportunidade de fazer aqui (já que você não pretende divulgar imediatamente; esta é uma fita que vai ficar para o futuro. Eu nunca pensei que tivesse a oportunidade de falar para o futuro. Acho que é uma pretensão muito grande. Mas, em todo o caso, como você está a abrir essa porta, eu vou falar para o futuro). Eu queria dizer que no século passado (XIX) e, isto não é um sonho, uma ilusão, é uma convicção adquirida através de pesquisas que eu fiz e que nunca revelei a ninguém, levado por uma revelação; uma revelação inesperada através de um médium inteiramente ignorante do assunto e que me abriu o caminho para uma possibilidade muito interessante. Vamos esclarecer isto. No século XIX eu estive na França, realmente, mas não era francês. Eu era português. Eu morava em Portugal, onde tive uma encarnação. Eu fui parar a França como exilado. E como exilado tomei conhecimento do Espiritismo, mas não o aceitei porque eu era católico. E era um tipo católico muito comum, aliás, em Portugal, naquela época. Discordava dos padres, brigava com o clero e não aceitava muito o catolicismo. O meu desejo era encontrar uma forma de fazer o Cristianismo voltar ao seu estado primitivo, quer dizer, voltar à verdade pura do Cristo. Era este o meu desejo. Como naquela época eu era também jornalista, como sou hoje, isso ficou gravado em alguns jornais portugueses, o que se pode constatar. 

(Rizzini) – Um pormenor, Herculano. Você se lembraria do nome que tinha? 

(Herculano) – Eu não quero dizer, Rizzini. Você me perdoa isso, mas eu não quero dizer. Eu sei que nessa ocasião... 

(Rizzini) – Mas esta é uma entrevista para o futuro. 

(Herculano) – Sim, eu sei, mas o futuro depois verá. Mas eu tive, então, oportunidade de saber que se estava processando uma nova revelação, mas Portugal era um país profundamente católico e qualquer infiltração de outra religião lá seria prejudicial, porque o povo não estava à altura, segundo eu pensava, de aceitar uma nova concepção de Deus. Então, não adoptei o Espiritismo. Continuei católico até ao fim, mas um católico às avessas, porque continuamente em luta com o próprio clero. Então, eu diria a você: não tenho a certeza que eu vi algum livro espírita, mas sei que tive conhecimento do Espiritismo. Mas se eu visse O Livro dos Espíritos em Paris, nesse dia 14 de julho, naquela época (na data da tomada da Bastilha) eu, certamente, não teria o impacto que hoje me provocaria essa visão. Porque não sabia ainda o que era o Espiritismo, nem tinha possibilidade de saber que ele realizava aquele meu sonho: o sonho da volta ao Cristianismo primitivo. Só depois de passar para o mundo espiritual foi que eu tive contacto pleno com a nova revelação. Interessante: foi no Espaço que eu me tornei espírita. Quando eu vim para a Terra, portanto, nascendo aqui no Brasil dessa vez – e nascendo em Avaré, no Estado de São Paulo, no dia 25 de setembro de 1914... 

(Rizzini) – E no meio católico... 

(Herculano) – Também numa família católica. Tendo educação católica, eu, entretanto, já trazia ideias espíritas bem acentuadas, que se foram revelando em mim independentemente de qualquer influência exterior. De maneira que, agora sim, se eu tivesse depois disso um encontro com O Livro dos Espíritos numa livraria de Paris, para mim seria uma grande emoção, uma emoção extraordinária. 

(Rizzini) – E se você encontrasse numa das ruas do centro de Paris, de súbito, ao dobrar uma esquina, a figura de Allan Kardec? 

(Herculano) – Bem... Se eu o encontrasse agora, nesta época, quer dizer, depois que sou espírita, então para mim seria uma coisa extraordinária, porque Allan Kardec representa a figura exponencial dos novos tempos na Terra. Jesus veio para implantar no mundo o Reino de Deus – e realmente ele realizou esse trabalho maravilhoso, pois implantou-o no coração e na consciência dos poucos homens que foram capazes de compreendê-lo até hoje – e o Reino de Deus vai desenvolvendo-se lentamente através dos séculos, vai realizando-se apesar dos homens. De maneira que Jesus representou essa figura extraordinária, e Kardec é o seu continuador. Kardec foi aquele que veio trabalhar na era decisiva da implantação do Reino de Deus em maior amplitude. Kardec é quem trouxe a revelação que o Espírito de Verdade transmitiu; ele trouxe essa possibilidade extraordinária de abrir as perspectivas do mundo para uma era inteiramente nova que está nascendo aos nossos olhos neste momento, neste século XX. 

Herculano Pires, certamente tomado por um súbito sentimento de pejo, não revelou o nome que tivera na existência anterior em Portugal, mas anos depois de sua desencarnação pesquisei a vida dos grandes vultos da literatura lusitana do século XIX e descobri inúmeros pontos de contacto (a começar pelo nome) entre ele e o célebre jornalista, romancista, poeta e historiador Alexandre Herculano, o qual ao tempo de Allan Kardec se exilara na França. O mesmo carácter impoluto e inflexível; o sentimento religioso; a oposição ao clero; o amor à literatura, particularmente à poesia e ao romance; e, sobretudo, a fidelidade à verdade. 

A propósito da extremada fidelidade à verdade, medite o leitor sobre o seguinte texto, mas procurando descobrir se o autor é o Herculano nascido em Portugal ou o brasileiro: 

“Quando a justiça de Deus põe a pena na destra do historiador, ao passo que lhe põe na esquerda os documentos indubitáveis de crimes que pareciam escondidos para sempre debaixo das lousas, ele deve seguir avante sem hesitar, embora a hipocrisia ruja em redor, porque a missão do historiador tem nesse caso o que quer que seja de divina.” (4) 

Parece-nos evidente tratar-se de um só Espírito. 

As informações sobre a reencarnação de Herculano Pires foram por mim guardadas, sigilosamente, durante décadas. Somente dias atrás, em conversa com Heloísa Pires, me referi à pesquisa, mas antes que lhe revelasse o resultado ela exclamou sorrindo: 

– Meu pai é a reencarnação de Alexandre Herculano. O pai, certa vez, comentou isso! 

Não foi, pois, por outra razão que quatro anos antes da desencarnação Herculano Pires redigira um extenso e belo artigo exaltando a sua antiga pátria e o renascimento do movimento espírita lusitano. (5) 

Não estamos, porém, dogmatizando, mesmo porque o julgamento final cabe, evidentemente, ao leitor. 

/... 
(1) Vide a obra Curso Dinâmico de Espiritismo, capítulo 20, editora Paidéia. 
(2) Herculano Pires desde menino gostava de fazer anotações num diário. Escreveu vários. Num deles anotou estes pensamentos: “Às vezes me pergunto por que este prazer mórbido de registar num diário os acontecimentos, os pensamentos, as emoções, as ocorrências de uma vida obscura. (...) O facto é que anoto, registo, comento, protesto, censuro e louvo para mim mesmo – ao menos assim me parece – mas nem por isso deixo de pensar, às vezes, que estes rabiscos possam ter um destino diferente, um endereço oculto.” Palavras proféticas, porque os rabiscos de Herculano Pires tinham, realmente, um endereço oculto: o meu, o de seu futuro biógrafo. 
(3) A entrevista completa encontra-se no meu livro Imortalidade
(4) Texto extraído do volume terceiro, página 192, da obra Opúsculos, de Alexandre Herculano (autor, inclusive, da História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal). 
(5) Vide a revista “Estudos Psíquicos”, de Lisboa, edição de junho de 1975. 


Jorge RizziniJosé Herculano Pires o Apóstolo de Kardec o Homem, a Vida, a Obra, Apresentação e, Apêndice – Herculano Pires revela uma sua encarnação, 1º fragmento da obra. 
(imagem de contextualização: Jorge Rizzini, o homem)