segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Diálogos de Kardec ~


PROFISSÃO DE FÉ ESPÍRITA RACIOCINADA

§ I. Deus 

1. Há um Deus, inteligência suprema, causa primária de todas as coisas

A prova da existência de Deus está neste axioma: Não há, absolutamente, efeito sem causa. Vemos incessantemente uma multidão inumerável de efeitos, cuja causa não está na humanidade, já que a humanidade é impotente para produzi-los e, mesmo para explicá-los; a causa está, portanto, acima da humanidade. É esta causa a que se chama Deus, Jeová, Alá, Brahma, Fo-Hi, Grande Espírito, etc., segundo as línguas, os tempos e os lugares. 

Esses efeitos não se produzem absolutamente ao acaso, fortuitamente e sem ordem; desde a organização do mais pequeno insecto e do menor grão, até à lei que rege os mundos que circulam no Espaço, tudo atesta um pensamento, uma combinação, uma previdência, uma solicitude que ultrapassam todas as concepções humanas. Esta causa é, portanto, soberanamente inteligente. 

2. Deus é eterno, imutável, imaterial, único, todo-poderoso, soberanamente justo e bom

Deus é eterno; se houvesse tido um começo, alguma coisa teria existido antes dele; teria saído do nada, ou melhor, teria criado a si próprio através de um ser anterior. É assim que, pouco a pouco, remontamos ao infinito na eternidade. 

Ele é imutável; se estivesse sujeito a mudanças, as leis que regem o Universo não teriam nenhuma estabilidade. 

Ele é imaterial; quer dizer, que a sua natureza difere de tudo o que chamamos matéria, de outro modo, ele estaria sujeito às flutuações e às transformações da matéria e, não seria imutável

Ele é único; se houvesse vários Deuses, haveria várias vontades e, desde então, não haveria nem unidade de vistas, nem unidade de poder na ordenação do Universo. 

Ele é todo-poderoso, porque é único. Se não tivesse o poder soberano, haveria alguma coisa mais poderosa que ele; ele não teria feito todas as coisas e, as que não tivesse feito seriam obra de um outro Deus. 

Ele é soberanamente justo e bom. A sabedoria providencial das leis divinas revela-se nas menores coisas como nas maiores e, essa sabedoria não permite duvidar nem da sua justiça, nem da sua bondade. 

3. Deus é infinito em todas as suas perfeições. Se supuséssemos imperfeito um só dos atributos de Deus, se subtraíssemos a menor parcela de eternidade, de imutabilidade, de imaterialidade, de unidade, de todo-poder, da justiça e da bondade de Deus, poderíamos supor um ser que possuísse o que lhe faltasse e, este ser, mais perfeito que ele, seria Deus. 

§ II. A alma 

4. Há no homem um princípio inteligente a que chamamos ALMA ou ESPÍRITO, independente da matéria e, que lhe dá o senso moral e a faculdade de pensar. 

Se o pensamento fosse uma propriedade da matéria, ver-se-ia a matéria bruta pensar; ora, como nunca se viu a matéria inerte dotada de faculdades intelectuais; e quando o corpo está morto, ele já não pensa, é preciso concluir que a alma é independente da matéria e, que os órgãos são apenas instrumentos com a ajuda dos quais o homem manifesta o seu pensamento. 

5. As doutrinas materialistas são incompatíveis com a moral e subversivas da ordem social. 

Se, segundo os materialistas, o pensamento fosse segregado pelo cérebro, como a bílis é segregada pelo fígado, resultaria que, com a morte do corpo, a inteligência do homem e todas as suas qualidades morais retornariam ao nada; que os pais, os amigos e todos aqueles a quem fomos afeiçoados, estariam perdidos, sem retorno; que o homem de génio não teria mérito, já que deveria as suas faculdades transcendentais apenas ao acaso de sua organização; que não haveria entre o imbecil e o sábio, senão a diferença de mais ou menos cérebro. 

As consequências desta doutrina seriam de que o homem, não esperando nada além desta vida, não teria nenhum interesse em fazer o bem; que seria muito natural procurar para si os prazeres maiores possíveis, mesmo que fosse à custa de outrem; que haveria estupidez em se privar em favor dos outros; que o egoísmo seria o sentimento mais racional; que aquele que é obstinadamente infeliz na Terra, não teria nada de melhor a fazer do que matar-se, já que, devendo cair no nada, tanto faria para ele e, que abreviaria os seus sofrimentos. 

A doutrina materialista é, portanto, a sanção do egoísmo, fonte de todos os vícios; a negação da caridade, fonte de todas as virtudes e a base da ordem social e, a justificação do suicídio

6. A independência da alma é provada pelo Espiritismo. 

A existência da alma é provada pelos actos inteligentes do homem, que devem ter uma causa inteligente e não uma causa inerte. A sua independência da matéria é demonstrada de uma maneira patente pelos fenómenos espíritas que a mostram agindo por si própria e, sobretudo pela experiência de seu isolamento durante a vida, o que lhe permite manifestar-se, pensar e agir na ausência do corpo. 

Pode dizer-se que, se a química separou os elementos da água, se ela colocou por isso as suas propriedades a descoberto e, se ela pode à vontade desfazer e refazer um corpo composto, o Espiritismo pode, igualmente, isolar os dois elementos constitutivos do homem: o espírito e a matériaa alma e o corpo, separá-los e reuni-los à vontade, o que não pode deixar dúvida sobre a sua independência. 

7. A alma do homem sobrevive ao corpo e conserva a sua individualidade depois da morte. 

Se a alma não sobrevivesse ao corpo, o homem não teria como perspectiva senão o nada, assim como, se a faculdade de pensar fosse o produto da matéria; se não conservasse a sua individualidade, quer dizer, se fosse perder-se no reservatório comum chamado o grande todo, como as gotas de água no oceano, seria igualmente, para o homem, o nada do pensamento e, as consequências seriam absolutamente as mesmas do que se não tivesse alma. 

A sobrevivência da alma após a morte é provada de uma maneira irrecusável e, de alguma sorte palpável, pelas comunicações espíritas. A sua individualidade é demonstrada pelo carácter e as qualidades próprias de cada um; essas qualidades que distinguem as almas umas das outras, constituem a sua personalidade; se fossem confundidas num todo comum, teriam apenas qualidades uniformes. 

Além destas provas inteligentes, há ainda a prova material das manifestações visuais ou aparições, que são tão frequentes e tão autênticas, que não é permitido colocá-las em dúvida. 

8. A alma do homem é feliz ou infeliz após a morte, segundo o bem ou o mal que tenha feito durante a vida. 

Desde que se admita um Deus soberanamente justo, só se pode admitir que as almas tenham um destino comum. Se a posição futura do criminoso e do homem virtuoso devesse ser a mesma, isso excluiria qualquer utilidade em procurar fazer o bem; ora, supor que Deus não faz diferença entre aquele que faz o bem e aquele que faz o mal, seria negar a sua justiça. O mal, não recebendo sempre a sua punição, nem o bem, a sua recompensa durante a vida terrestre, é necessário daí concluir que a justiça será feita depois, sem o que, Deus não seria justo. 

As penas e as alegrias futuras são, além disso, materialmente provadas pelas comunicações que os homens podem estabelecer com as almas daqueles que viveram e, que vêm descrever o seu estado feliz ou desgraçado, a natureza de suas alegrias ou de seus sofrimentos e, dizer-lhes a causa. 

9. Deus, a alma, a sobrevivência e a individualidade da alma depois da morte do corpo, penas e recompensas futuras, são os princípios fundamentais de todas as religiões

O Espiritismo vem acrescentar às provas morais desses princípios, as provas materiais dos factos e da experimentação e, arrasar com os sofismas do materialismo. Em presença dos factos, a incredulidade já não tem razão de ser; é assim que o Espiritismo vem devolver a fé àqueles que a perderam e, tirar as dúvidas dos incertos. 

§ III. A Criação 

10. Deus é o criador de todas as coisas. Esta proposição é a consequência da prova da existência de Deus (nº 1). 

11. O princípio das coisas está nos segredos de Deus. 

Tudo diz que Deus é o autor de todas as coisas, mas quando e como as criou? A matéria é como ele de toda a eternidade? É isso que ignoramos. Sobre tudo o que não julgou revelar-nos a respeito, só se pode estabelecer sistemas mais ou menos prováveis. Pelos efeitos que vemos, podemos remontar a certas causas; mas há um limite que nos é impossível ultrapassar e, seria ao mesmo tempo perder o seu tempo e expor-se a equivocar-se, querer ir além. 

12. O homem tem como guia na busca do desconhecido, os atributos de Deus

Na busca dos mistérios que nos é permitido sondar pelo raciocínio, há um critério certo, um guia infalível: são os atributos de Deus. 

Desde que se admita que Deus deve ser eternoimutávelimaterialúnicotodo-poderososoberanamente justo e bom, que é infinito nas suas perfeições, qualquer doutrina ou teoria, científica ou religiosa, que tendesse a suprimir-lhe uma parcela de um só de seus atributos, seria necessariamente falsa, já que tenderia à negação da própria divindade. 

13. Os mundos materiais tiveram um começo e terão um fim. 

Que a matéria seja de toda a eternidade como Deus, ou que tenha sido criada numa época qualquer, é evidente, segundo o que acontece quotidianamente sob os nossos olhos, que as transformações da matéria são temporárias e, que dessas transformações resultam os diferentes corpos que nascem e se destroem incessantemente. 

Os diferentes mundos sendo produtos da aglomeração e da transformação da matéria, devem, como todos os corpos materiais, ter tido um começo e ter um fim, segundo leis que nos são desconhecidas. A Ciência pode, até um certo ponto, estabelecer as leis de sua formação e remontar ao seu estado primitivo. Toda a teoria filosófica em contradição com os factos demonstrados pela Ciência, é necessariamente falsa, a menos que prove que a Ciência está errada. 

14. Criando os mundos materiais, Deus criou também seres inteligentes a que chamamos espíritos. 

15. A origem e o modo de criação dos espíritos nos são desconhecidos; sabemos somente que foram criados simples e ignorantes, quer dizer, sem ciência e sem conhecimento do bem e do mal, mas perfectíveis e com uma igual aptidão para tudo conquistar e tudo conhecer com o tempo. No princípio, estão numa espécie de infância, sem vontade própria e sem consciência perfeita de sua existência. 

16. À medida que o espírito se afasta do ponto de partida, as ideias nele se desenvolvem, como na criança e, com as ideias, o livre-arbítrio, quer dizer, a liberdade de fazer ou não fazer, de seguir tal ou qual caminho para o seu adiantamento, o que é um dos atributos essenciais do espírito. 

17. O objectivo final de todos os espíritos é de atingir a perfeição da qual é susceptível a criatura; o resultado dessa perfeição é a alegria da felicidade suprema que é a consequência e, à qual chegam mais ou menos prontamente, segundo o uso que fazem do seu livre-arbítrio. 

18. Os espíritos são agentes do poder divino; constituem a força inteligente da natureza e concorrem para a execução das visões do Criador para a manutenção da harmonia geral do Universo e das leis imutáveis da criação. 

19. Para concorrer, como agentes do poder divino, na obra dos mundos materiais, os espíritos revestem temporariamente um corpo material. Os espíritos encarnados constituem a humanidade. A alma do homem é um espírito encarnado. 

20. A vida espiritual é a vida normal do espírito: ela é eterna; a vida corporal é transitória e passageira: é apenas um instante na eternidade. 

21. A encarnação dos espíritos está nas leis da natureza; é necessária ao seu adiantamento e à execução das obras de Deus. Pelo trabalho que a sua existência corporal necessita, eles aperfeiçoam a sua inteligência e adquirem, observando a lei de Deus, os méritos que devem conduzi-los à felicidade eterna. Daí resulta que, concorrendo para a obra geral da criação, os espíritos trabalham para o seu próprio adiantamento. 

22. O aperfeiçoamento do espírito é o fruto de seu próprio trabalho; progride na razão da sua maior ou menor actividade ou da boa vontade para adquirir as qualidades que lhe faltam. 

23. Não podendo o espírito adquirir numa só existência corporal todas as qualidades morais e intelectuais que devem conduzi-lo ao objectivo, ele aí chega através de uma sucessão de existências, em cada uma das quais dá alguns passos adiante, no caminho do progresso e, purifica-se de algumas de suas imperfeições. 

24. A cada nova existência, o espírito traz o que adquiriu em inteligência e em moralidade, nas suas existências precedentes, assim como os germens das imperfeições das quais ainda não se despojou. 

25. Quando uma existência foi mal-empregada pelo espírito, quer dizer, se não fez nenhum progresso no caminho do bem, ela não tem proveito para ele e, ele deve recomeçá-la em condições mais ou menos penosas, em razão da sua negligência e de seu malquerer. 

26. Devendo o espírito a cada existência corporal adquirir alguma coisa de bem e despojar-se de alguma coisa de mal, daí resulta que, após um certo número de encarnações, encontra-se depurado e chega ao estado de espírito puro. 

27. O número das existências corporais é indeterminado; depende da vontade do espírito abreviá-la, trabalhando activamente para o seu aperfeiçoamento moral. 

28. No intervalo das existências corporais, o espírito é errante e vive a vida espiritual. A erraticidade não tem duração determinada. 

29. Quando os espíritos adquiriram num mundo a soma de progresso que comporta o estado desse mundo, deixam-no para encarnar num outro mais adiantado, onde adquirirão novos conhecimentos, e assim, sucessivamente, até que a encarnação num corpo material não lhe sendo já útil, vivem exclusivamente a vida espiritual, onde progridem ainda num outro sentido e através de outros meios. Tendo chegado ao ponto culminante do progresso, desfrutam da suprema felicidade; admitidos nos conselhos do Todo-Poderoso, têm o seu pensamento e tornam-se os seus mensageiros, os seus ministros directos para o governo dos mundos, tendo sob as suas ordens os espíritos de diferentes graus de adiantamento. 

/… 


ALLAN KARDEC, Obras Póstumas, Primeira Parte, PROFISSÃO DE FÉ ESPÍRITA RACIOCINADA, I Deus, II A alma, III Criação, 11º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: Dança rebelde, 1965 – Óleo sobre tela, de Noêmia Guerra

sábado, 5 de novembro de 2022

O peregrino sobre o mar de névoa ~


Tratamento de Vícios e Perversões

Levados pelas excitações novidadeiras do momento de transição que atravessamos, certas instituições mal dirigidas pretendem modernizar as práticas doutrinárias, suprimindo as sessões mediúnicas e substituindo-as por reuniões de estudos doutrinários. Alegam que a doutrinação e esclarecimento dos espíritos inferiores é função dos espíritos superiores, no plano espiritual. Essa é uma boa maneira de fugir às responsabilidades doutrinárias e cortar as ligações do homem com os espíritos, relegando-os ao silêncio misterioso dos túmulos, onde, na verdade, não se encontram. Foi essa a maneira que os cristãos fascinados pelo poder romano, na fase de romanização do Cristianismo, encontraram, para se livrarem das manifestações agressivas dos espíritos rancorosos, contrários aos ensinamentos evangélicos, sem perceberem que se desligavam assim do mundo espiritual. A supressão dos cultos pneumáticos – sessões mediúnicas da era apostólica –, permitiu a romanização da Igreja, frustrando-lhe os objectivos espirituais. O mundo espiritual é unitário e orgânico, exactamente como o mundo material. Cortar a ligação humana com a região inferior desse mundo é atentar contra ao princípio doutrinário da solidariedade dos mundos e constitui uma ingratidão para com os espíritos que deram a própria doutrina. Mais do que isso, é uma insensatez, pois não dispomos de meios para fazer essa cirurgia cósmica. A Igreja pagou caro a sua insensatez, tendo de recorrer mais tarde à revelação grega, à Filosofia de Platão (Santo Agostinho) e de Aristóteles (São Tomás de Aquino) para erigir com decalques e empréstimos a sua própria Filosofia. 

Por outro lado, a interpenetração dos mundos (espiritual e material) faz parte do sistema, ou seja, da organização universal, que não temos o direito de violar em favor do nosso comodismo, do nosso egoísmo e da nossa cegueira espiritual. Essa pretensão criminosa lembra a teoria do Espiritismo sem espíritos, de Morselli, famoso director da Clínica de Doenças Mentais de Génova, que, obrigado a aceitar a realidade dos factos, escapou do aperto por essa via estratégica. Querem os espíritas actuais seguir a esperteza do genovês ilustre, sem os seus ilustrados argumentos? 

A alegação de que os espíritos inferiores que nos perturbam são doutrinados no Além, o que dispensa o nosso trabalho nas sessões mediúnicas, é de estarrecer. Então essas criaturas que passaram anos assistindo e dirigindo sessões mediúnicas, doutrinando espíritos, não se doutrinaram a si mesmas? Não viram os espíritos necessitados a que se dirigiam, não ouviram as suas ameaças e os seus lamentos, passaram pelas actividades doutrinárias como cegos e surdos? Não aprenderam nos compêndios da doutrina que os espíritos apegados à matéria necessitam de esclarecimento – como o sedento necessita da água, como o escafandrista necessita do oxigénio da superfície para respirar no fundo do mar? Não aprenderam, com as pesquisas de Geley, que nas sessões mediúnicas se processa em fluxo contínuo a emissão de ectoplasma que permite aos espíritos sofredores sentirem-se amparados na matéria, como se ainda estivessem encarnados, para poderem compreender as explicações doutrinárias? Não aprenderam que os espíritos superiores descem às sessões mediúnicas para poderem comunicar-se com entidades sofredoras inadaptadas ainda aos planos elevados? Querem negar a realidade dolorosa das obsessões e entregar totalmente os obsidiados ao internamento das clínicas de Morselli? Não sabem que a relação homem-espírito é uma condição permanente dos mundos inferiores como o nosso, em que a maioria dos espíritos desencarnados permanece apegada à Terra e por isso necessita do socorro das sessões mediúnicas? Annie Besant, a admirável autora de A Sabedoria Antiga, discípula e sucessora de Blavatsky na presidência da Sociedade Teosófica Mundial – apesar da repulsa dos teósofos às práticas mediúnicas –, abriu uma excepção no aludido livro, ensinando que, no caso de perturbações de espíritos numa casa, se alguém tiver coragem de falar com a entidade e provar-lhe que já morreu, conseguirá afastá-la. A grande teosofista reconhece a necessidade e a eficácia da doutrinação espírita e, os próprios espíritas querem agora, tardiamente, assumir a atitude teosófica que o próprio Sr. Sinet, teósofo do mais alto prestígio, condenou no seu livro Incidentes da Vida da Sra. Blavatsky. Sinet corrige esta (a sua mestra) no tocante à teoria dos cascões astrais e sustenta a legitimidade das manifestações mediúnicas. Tudo isso é ignorância em excesso para representantes de Federações e outras instituições espíritas que visitam grupos e centros, como fiscais de feira, mandando suspender as sessões mediúnicas. 

Nas perversões sexuais e sensoriais em geral, bem como nos casos de toxicomania, a doutrinação dos espíritos vampirescos é indispensável ao êxito da terapia. Porque nesses casos estão sempre envolvidos pelo menos o vampiro espiritual e o vampirizado encarnado. Se não se obtiver o desligamento dessas vítimas recíprocas, não se conseguirá a cura. Os que defendem a tese de Morselli no meio espírita, essa tese já há muito superada entre os próprios adversários gratuitos ou interesseiros da doutrina, passaram com armas e bagagens para o adversário. Não querem apenas a amputação da doutrina, pois na verdade querem a morte e a sepultura inglório do Espiritismo, como os teólogos católicos e protestantes da Teologia Radical da Morte de Deus querem enterrar o suposto cadáver de Deus na cova aberta pelo louco do Nietsche, que acabou morrendo louco. Sirva o exemplo do filósofo infeliz para os filosofantes imberbes e desprevenidos do nosso meio espírita. Não há nada mais desastroso para uma doutrina do que abrigar entre os seus adeptos criaturas que se deixam levar por cantos de sereias. Precisamos, com urgência, recorrer à táctica de Ulisses, mandando tapar com enchumaços de algodão os ouvidos desses ingénuos navegantes de mares perigosos. 

/… 


José Herculano Pires, Ciência Espírita e suas implicações terapêuticas, Tratamento de Vícios e Perversões (2 de 2), 12º fragmento desta obra. 
(imagem de contextualização: O peregrino sobre o mar de névoa, por Caspar David Friedrich