(II de III)
Os galeses, em geral, acreditavam firmemente no mundo
dos espíritos e nas suas manifestações. Eles apresentam, às vezes, nomes e
formas muito fantasiosas para isso. Os seus relatos deixam uma grande margem
para a imaginação. Entretanto, do conjunto dos factos relatados se deduz uma
série de testemunhos que não saberíamos recusar.
Por exemplo, no que se refere aos “espíritos
batedores da mina”, esses seres invisíveis que, pelos seus golpes surdos,
prolongados, repetidos, encorajam os mineiros e dirigem as suas pesquisas em
direcção aos melhores filões; eis o relatório redigido, sobre esse assunto,
pelo engenheiro Merris, homem muito estimado pelo seu saber e pela sua
probidade, publicado na revista Gentleman’s Magazine:
“As pessoas que não conhecem as artes e as
ciências ou o poder secreto da natureza zombarão de nós, mineiros de Cardigan,
que acreditamos na existência dos “batedores”. Eles são uma espécie de
génios bons, mas inapreensíveis, que não se vêem, mas se ouvem e, que
parecem trabalhar nas minas, isto é, que o “batedor” é o representante ou o
precursor do trabalho nas minas, como os sonhos o são de certos
acidentes que acontecem.
Quando foi descoberta a mina de Esgair y Myn, os
“batedores” nela trabalharam activamente, noite e dia e, um grande número de
pessoas os ouviram. Mas, após a descoberta da grande mina, não foram mais
ouvidos. Quando comecei a explorar as minas de Elwyn-Elwyd, os “batedores”
agiram tão fortemente, durante um certo tempo, que assustaram os jovens
operários. Quando removíamos as camadas de rochas, antes de chegar ao mineral,
é que os ruídos se fizeram mais fortes; eles cessaram quando nós atingimos o
mineral.
Sem dúvida, as nossas asserções serão discutidas.
Afirmo, entretanto, que os factos são reais, mesmo que não possa nem pretenda
explicá-los. Os cépticos podem rir; quanto a nós, mineiros, continuaremos a nos
alegrar e a agradecer aos “batedores”, ou melhor, a Deus, que nos envia
os seus conselhos.”
Os fenómenos de assombração não são raros no País de
Gales. Cita-se de bom grado tal casa ou tal castelo que os conheceram e
suportaram. O Sr. Le Goffic,
na sua viagem a Cardiff como delegado bretão à grande Assembleia solene de 1899,
recolheu uma grande série de relatos desse género, que ele publicou no seu
livro L’Âme Bretonne (A Alma Bretã).
A maioria desses relatos nos parecem muito marcados
de superstição. Cremos, portanto, que devemos indicar um testemunho sério, o
de Lady Herbert, ilustre patriota galesa, descendente dos antigos
reis “kymris”, que recebia a delegação no seu castelo de Llanover.
O Sr. Le Goffic cita
a conversa que teve sobre esse assunto com essa grande dama:
“O exemplo vem do Alto. Não se diz na Inglaterra que a
própria rainha tem o seu fantasma que ronda os apartamentos de Windsor? E esse
fantasma, vestido de negro, não é outro senão a grande Elisabeth.
O lugar-tenente Glynn, de guarda na biblioteca, percebeu
como o fantasma penetrou no quarto contíguo. Ora, esse quarto não tinha saída,
mas tivera uma, outrora, durante a vida de Elisabeth e, que foi fechada depois.
O lugar-tenente correu atrás do fantasma e chegou mesmo a tempo de vê-lo
introduzir-se na parede. O facto se reproduziu diversas vezes e o medo foi tão
grande, em Windsor, que foi preciso dobrar a guarda da noite.
Windsor tem a sua dama negra, o meu castelo de Cold
Brooks tem a sua dama branca. Vós perguntais qual o sentido dessas aparições?
Ora, como a igreja nos explica, são almas em sofrimento que pedem piedade dos
vivos esquecidos. Os outros espectros têm a função de avisadores. É
o caso, creio, da dama negra de Windsor: a sua presença anuncia sempre algum
facto grave, uma guerra ou catástrofe próxima.
Os avisos, ou como vós dizeis na Bretanha, os
“intersignos”, revestem todas as formas. Algumas vezes essas formas são
especiais para certas famílias. Os Grey de Ruthwen são avisados da morte dos
seus membros pela aparição de uma carruagem, com quatro cavalos negros.
A família Airl, quando um dos seus membros está perto
da hora da morte, ouve um rufo de tambor. Num jantar, estando presente um
desses Airl, alguém lhe perguntou como passatempo: “Qual é, então, o
‘intersigno’ de sua família?” – “O tambor”. E, como para atestar o facto, um
rufo, surdo e velado, soou ao longe. Lord Airl empalideceu; algum tempo depois,
um mensageiro veio anunciar que um dos membros de sua família estava morto.
Os Mac-Gwenlyne, descendentes do célebre clã desse
nome, possuem há séculos, no norte da Escócia, o velho solar de Fairdhu: uma
grande abóbada curvada lhe dá o acesso e, julga-se que a pedra que serve de
base para essa abóbada começa a tremer quando um Mac-Gwenlyne vai
morrer...”
Os casos de castelos e lugares assombrados são
tão numerosos na Escócia que não citamos todos. Sabe-se que esse país é a terra
clássica dos videntes, dos fantasmas e dos espíritos familiares. O aspecto
melancólico das suas regiões, cobertas de neblina e, das suas ruínas presta-se
às visões e às evocações.
Ainda nos nossos dias, a sombra de Mary
Stuart não apareceu a Lady
Caithness, Duquesa de Pomar, na capela real de Holyrood, onde se alinham os
túmulos dos reis da Escócia? Na sua sumptuosa casa da rua Brémontier, em Paris,
em dias de reuniões psíquicas, a duquesa se comprazia em nos contar a sua
palestra nocturna com a infortunada rainha.
/…
LÉON DENIS, O Génio Céltico e o Mundo Invisível,
Primeira Parte – OS PAÍSES CÉLTICOS, CAPÍTULO III – O País de Gales. A Escócia.
A obra dos bardos (II de III), 12º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: A Apoteose dos heróis franceses que morreram pelo seu país durante a guerra da Liberdade, Ossian, Desaix, Kléber, Marceau, Hoche, Championnet,
pintura de Anne-Louis Girodet-Trioson)
Sem comentários:
Enviar um comentário