segunda-feira, 16 de novembro de 2015

há no universo duas imensas correntes de vida. Uma sobe do abismo pela animalidade; a outra desce das alturas divinas ~


Alma humana...

A lei do progresso não se aplica somente ao homem; é universal. Há, em todos os reinos da Natureza, uma evolução que foi reconhecida pelos pensadores de todos os tempos. Desde a célula verde, desde o embrião errante, boiando à flor das águas, a cadeia das espécies tem-se desenrolado através de séries variadas, até nós. |*

Cada elo dessa cadeia representa uma forma da existência que conduz a uma forma superior, a um organismo mais rico, mais bem adaptado às necessidades, às manifestações crescentes da vida; mas, na escala da evolução, o pensamento, a consciência e a liberdade só aparecem passados muitos graus. Na planta a inteligência dormita; no animal ela sonha; só no homem acorda, conhece-se, possui-se e torna-se consciente; a partir daí o progresso, de alguma sorte fatal nas formas inferiores da Natureza, só se pode realizar pelo acordo da vontade humana com as leis Eternas.

É pelo acordo, pela união da razão humana com a razão divina que se edificam as obras preparatórias do reino de Deus, isto é, do reino da sabedoria, da justiça, da bondade, de que todo o ser racional e consciente tem em si a intuição.

Assim, o estudo das leis da evolução, em vez de anular a espiritualidade do homem, vem, pelo contrário, dar-lhe uma nova sanção; ensina-nos como o corpo do homem pode derivar de uma forma inferior pela selecção natural, mas nos mostra também que possuímos faculdades intelectuais e morais de origem diferente e encontramos essa origem no universo invisível, no mundo sublime do Espírito.

A teoria da evolução deve ser completada pela da percussão, isto é, pela acção das potências invisíveis, que activa e dirige essa lenta e prodigiosa marcha ascensional da vida do Globo. O mundo oculto intervém, em certas épocas, no desenvolvimento físico da humanidade, como intervém no domínio intelectual e moral, pela revelação medianímica. Quando uma raça que chegou ao apogeu é seguida de uma nova raça, é racional acreditar que uma família superior de almas encarna entre os representantes da raça exausta para fazê-la subir um grau, renovando-a e moldando-a à sua imagem. É o eterno himeneu entre o céu e a Terra, a infinita penetração da matéria pelo espírito, a efusão crescente da vida psíquica na forma em evolução.

O aparecimento do homem na escala dos seres pode explicar-se dessa forma. O homem, demonstra-nos a embriogenia, é a síntese de todas as formas vivas que o precederam, o último elo da longa cadeia de vidas inferiores que se desenrola através dos tempos. Mas isso é apenas o aspecto exterior do problema das origens, ao passo que amplo e imponente é o aspecto interior. Assim como cada nascimento se explica pela descida à carne de uma alma que vem do espaço, assim também o primeiro aparecimento do homem no Planeta, deve ser atribuído a uma intervenção das Potências invisíveis que geram a vida. A essência psíquica vem comunicar às formas animais evoluídas o sopro de uma nova vida; vai criar, para a manifestação da inteligência, um órgão até então desconhecido: a palavra. Elemento poderoso de toda a vida social, o verbo aparecerá e, ao mesmo tempo, a alma encarnada conservará, mediante o seu invólucro fluídico, a possibilidade de entrar em relação com o meio |** donde saiu.

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|* Os seres monocelulares encontram-se ainda hoje aos biliões, em cada organismo humano. Não foi de uma única célula que saiu a série das espécies; foi, antes, a multidão das células que se agrupou para formar seres mais perfeitos e, de degrau em degrau, convergir para a unidade.
|** Qualquer que seja a teoria a que se dê preferência nessas matérias, adoptem-se as vistas de Darwin, de Spencer ou de Haeckel, não é possível crer-se que a Natureza, que Deus apenas tenha um só e único meio de produzir e desenvolver a vida. O cérebro humano é limitado; as possibilidades da vida são infinitas. Os pobres teóricos, que querem enclausurar toda a ciência biológica dentro dos estreitos limites de um sistema, fazem-nos sempre lembrar o menino da lenda, que queria meter toda a água do oceano num buraco feito na areia da praia.
O próprio professor Charles Richet declarou, na sua resposta a Sully-Prudhomme: “As teorias da selecção são insuficientes.” E nós acrescentaremos: “Se há unidade de plano, deve haver diversidade nos meios de execução. Deus é o grande artista que, dos contrastes sabe fazer resultar a harmonia. Parece que há no universo duas imensas correntes de vida. Uma sobe do abismo pela animalidade; a outra desce das alturas divinas. Vão ambas ao encontro uma da outra para se unirem e se confundirem e mutuamente se atraírem. Não é essa a significação que tem a escada do sonho de Jacob?”



LÉON DENIS, O Problema do Ser, do Destino e da Dor,  IX – Evolução e finalidade da alma, fragmento.
(imagem de contextualização: Head of Divine Vengeance, pintura de Pierre-Paul Prud'hon)

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