Em torno do ser profundo de Victor Hugo ~
Por mais profunda que seja a crítica em relação à
personalidade de Victor Hugo,
nela não penetrará enquanto não medir a sua existência com o critério
palingenésico ou "sentido" da reencarnação do ser. Se Hugo teve
inúmeras alternativas morais foi porque o seu ser penetrava nas
misteriosas zonas de uma realidade pré-existencial. A crítica comum, quando
se trata de grandes espíritos, opina sempre ignorando a natureza profunda que
os conforma. Enquanto a crítica desconhecer que génio e mediunidade são
uma e a mesma essência, não poderá nunca penetrar nesses "mundos" que
se movem no infinito das almas.
Victor Hugo sabia que no seu ser se entrecruzavam
incontáveis existências por ele vividas; daí as suas variações de carácter,
as suas angústias e tristezas, as suas aproximações repentinas dos mais
variados climas espirituais. O seu espírito projectava no circundante as suas
sondas psíquicas até extrair da essência das coisas a sua substância infinita.
Assim se relacionava com a alma verdadeira dos seres e das
coisas; desse modo o seu ser se colocava em comunicação com o outro Eu das
pessoas, que é onde se encontra o verdadeiro espírito encarnado.
O seu génio, logicamente, não pôde revelar aos seus íntimos
e amigos a realidade profunda que percebia no todo existente. Ocultava
sempre segredos espirituais, falava de temas eternos de acordo com o sentir
comum, pois sabia ser inoportuno revelar o que acontecia por esse
sentido palingenésico do seu Ser, que o acompanhou em toda a sua vida. Ateve-se
sempre à medida evolutiva dos espíritos, compreendendo que a realidade
espiritual do homem não pode estar ao alcance de todos.
Os filósofos quiseram perguntar sobre a origem do seu génio
penetrando nas circunvoluções do seu cérebro. Pretenderam estimar a sua
inteligência conforme o peso desse órgão. O próprio Victor Hugo doou à ciência
o seu organismo cerebral para que, não existindo nenhuma diferença substancial
nos cérebros, fosse investigado, depois da sua morte, se havia qualquer
disparidade entre a organização dele e da massa cerebral dos animais. Por essa
razão, resolveu que a investigação deveria ser praticada no cérebro do seu
próprio cão, "com a finalidade de descobrir se haveria algo diferente na
substância ou organização de algum dos órgãos cerebrais que pudesse servir de
base para apreciar os vários graus de inteligências".
(1) - Doutor Franco Ponte: Los cérebros de Victor Hugo y
Alberto Einstein, Revista Cosmo, 1995, Ponce, Puerto Rico.
A informação dada pela comissão médica examinadora foi a
seguinte: "Não encontramos nenhuma molécula a mais de matéria cinzenta no
cérebro de Victor Hugo que na do cão. Achamos diferença de volume e peso somente,
que acreditamos não afectarem nada as manifestações intelectuais, pois é sabido
que existem entidades de escassa inteligência com cérebros volumosos e
vice-versa, entidades de vastos conhecimentos em cérebros muito pequenos".
Ocorreu o mesmo quando se examinou o cérebro de Alberto
Einstein, este outro ser que comoveu as bases da ciência oficial. O parecer
assinalava: "Nada encontramos que nos conduza ao caminho da verdade",
ao que se acrescentou: "Nada foi encontrado e estamos certos de que o
cérebro de Einstein é igual na sua estrutura e forma física a todos os cérebros
dos seres comuns".
Estas conclusões demonstram que a caixa craniana não encerra
e não gera a inteligência do ser. Dá-se conta que os lóbulos cerebrais não
segregam as ideias como os rins e a urina e que o materialismo está assente
sobre bases irreais no que se refere à espiritualidade do homem.
A concepção espírita, que vai além do espiritualismo
clássico, tem demonstrado mediante a observação de numerosos factos, que os
lóbulos cerebrais não são mais que órgãos pelos quais se manifesta o ser e o
pensamento. Consequentemente, o génio de Victor Hugo não esteve radicado na
fisiologia especial de seu cérebro, ou seja, o grande poeta de Raios e
Sombras, não possuía um cérebro extraordinariamente desenvolvido, pelo
contrário, o génio é que foi a causa do seu grande desenvolvimento espiritual.
O homem Victor Hugo não era igual ao homem comum, sujeito às
limitadas percepções dos cinco sentidos corporais. O grande poeta francês foi
um exemplo de homem palingenésico dotado, por essa mesma razão, do
sexto sentido ou da mediunidade altamente
desenvolvida. Assim é que foi vidente, profeta e poeta e pôde compreender o
que significam espiritualmente as grandes epopeias da humanidade. Compreendeu
assim que a Revolução Francesa sem uma revolução espiritual não seria mais que
um fenómeno político de ordem local.
Descobriu também que em cada homem pode estar
reencarnado um rei, um mendigo, um santo ou um malfeitor; por isso o poeta
conseguiu perceber que as verdadeiras raízes da história estão no
espírito. Para Hugo os processos sociais eram o resultado de impulsos
morais provenientes de espíritos reencarnados e não cegos tumultos políticos. O
próprio Jean Valjean,
condenado por roubar um pão, pôde ser, de acordo com as visões espíritas do
poeta, um espírito reencarnado com a missão de obrigar os poderosos a não
serem, impiedosos para com os miseráveis da terra.
Mas, por que se ocultam e dissimulam as ideias espíritas de
Victor Hugo? Será que o génio é grande somente quando apoia a cultura
materialista?
A única coisa que nos atrevemos a responder é que Victor Hugo havia
sobrepujado as velhas concepções espirituais e que o seu génio pôde abrir as
asas mercê do que as revelações mediúnicas da Ilha de Jersey tão objectivamente
demonstraram. Eis o que tentaremos ver nos próximos capítulos
/…
Humberto Mariotti, Victor Hugo Espírita, Em torno do ser profundo de Victor Hugo, 4º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: Criança com uma boneca,
pintura de Anne-Louis
GIRODET-TRIOSON)
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