Introdução '
Apenas um real e positivo idealismo pode dar vigor e energia
à natureza humana.
Apenas um ideal que seja capaz de sobrepor-se à dura
realidade do dia-a-dia pode ajudar o homem a lutar contra aquilo que está
destruindo o verdadeiro sentido da vida.
Este ideal está na beleza, na justiça e no bem, mas,
principalmente, na poesia que simultaneamente pode vincular o homem
tanto ao humano quanto ao transcendente.
O homem como Ideia poderá olhar de frente e com segurança o
mundo material e o mistério do universo; mas, considerado como um reflexo dos
fenómenos físicos, o homem será um ser sem liberdade e sujeito ao mecanismo do
meio em que está situado. Porém, a vontade humana será real apenas mediante a
auto-liberdade do ser. O Ideal é como o vapor que pode movimentar um grande
volume de ferro, razão pela qual o homem não será o verdadeiro motor da
história enquanto for considerado como um reflexo do meio em que vive. O homem,
a moral e a sociedade serão realidades criadoras apenas quando
a vontade puder gerar a sua própria liberdade sobre a base de um ideal
inspirado na verdade.
Se o homem não for uma ideia soberana e criadora será um ser
sem dignidade. Será apenas um mecanismo que acciona as causas dos reflexos
circundantes e uma consequência das forças físicas sem nenhuma teleologia moral
ou espiritual. A verdade e a justiça não são anuladas por ser o homem uma
Ideia. O verdadeiro homem progressista é o que se sustenta pela força
da Ideia e, por isso mesmo, pelo Espírito. Os que são capazes de
forjar o bem para a humanidade são os que vivem iluminados pela luz que emana
da sua própria inteligência. São os que vivem sustentados pelo Ideal porque se
sentem a ideia que se sobrepõem às influências opressoras dos fenómenos físicos.
Victor Hugo foi um exemplo do que dissemos. A sua
natureza poética não surgiu no seu Ser pelos reflexos do meio ambiente da sua
época. Ao contrário, o seu Ser foi poético, idealista e amante da justiça
porque esses valores morais estavam no seu espírito e não fora
dele. Não se chega a escrever um poema somente com os reflexos materiais
que influem sobre a inteligência. Um poema escreve-se quando o espírito possui
as condições indispensáveis para dar curso a esse fenómeno poético.
A verdade e a justiça não estarão no homem pela
acção reflexa do meio; tais valores éticos surgirão da Ideia que determina
o ser espiritual e social do homem. Surgem da consciência, que é onde Victor
Hugo falou a Deus e, logo, ao Espírito. O autor de Os Miseráveis foi
uma vida que lutou pela Ideia apesar dos mais variados obstáculos sociais que
atingiram a sua sensibilidade. Mas não foi um homem que amarrou o seu ideal ao
mundo exclusivo da matéria. A sua inteligência penetrou no Além não apenas para
ver uma nova imagem das coisas objectivas, mas para descobrir a essência da
vida imortal do Espírito.
Victor Hugo sabia que somente se constrói um mundo-novo
e melhor se as asas do pensamento não são atropeladas pelas garras da
vulgaridade e da indiferença. Por isso é necessário o Ideal, é indispensável a
Fé e urge conhecer o sentido da vida, posto que sem uma teleologia espiritual o
ser e a existência se apresentam como dois enigmas que desembocam num abismo.
Victor Hugo não se rendeu à morte e ao nada. Afirmou pela poesia a vida do
Espírito e da Ideia e lutou como um gigante para mostrar ao homem a essência
divina e imortal que se esconde na sua carne perecível.
/…
Humberto Mariotti, Victor Hugo Espírita,
Introdução 1º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: Victor Hugo | 1879,
retratado por Léon Bonnat)
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