Ao Leitor
Nas horas pesadas da vida, nos dias de tristeza e de acabrunhamento,
leitor, abre este livro! Eco das vozes do Alto, ele te dará coragem;
inspirar-te-á a paciência e a submissão às leis eternas!
Onde e como pensei em escrevê-lo? Numa tarde de inverno,
tarde de passeio na costa azulada da Provença.
Deitava-se o Sol sobre o mar pacífico. O seus raios de ouro,
resvalando sobre a vaga adormecida, acendiam tintas ardentes sobre o cimo das
rochas e dos promontórios, enquanto o delgado crescente lunar subia no céu sem
nuvens. Fazia-se grande silêncio, envolvendo todas as coisas. Solitário, um
sino longínquo, lentamente, soava o ângelus.
Pensativo, eu ouvia os ruídos abafados, os rumores apenas
perceptíveis das cidades de inverno em festa e as vozes que cantavam na minha
alma.
Pensava na indiferença dos homens que se inebriam de
prazeres para melhor esquecer o fim da vida, os seus imperiosos deveres, as
suas pesadas responsabilidades.
O mar balouçante, o Espaço que, pouco a pouco, se constelava
de estrelas, os odores penetrantes dos mirtos e dos pinheiros, as harmonias
longínquas na calma da tarde, tudo contribuía para derramar, em mim e em torno
de mim, um encanto subtil, íntimo e profundo.
E a voz me disse:
Publica um livro que nós te inspiraremos, um livrinho que
resuma tudo o que a Alma humana deve conhecer para se orientar
no seu caminho;
publica um livro que demonstre a todos não ser a vida uma
coisa vã de que se possa fazer uso leviano, e sim uma luta pela conquista do
Céu, uma obra elevada e grave de edificação, de aperfeiçoamento, regida por
leis augustas e equitativas, acima das quais paira a eterna Justiça, amenizada
pelo Amor.
/…
Léon Denis, O Grande Enigma, Ao Leitor 1 de 3, 1º fragmento da
obra.
(imagem: La Madonna de Port Lligat, detalhe | 1950, Salvador Dali)
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