Origem dos Celtas. Guerra dos gauleses. Decadência e
queda. Longa noite; o despertar. O movimento pancéltico ~
Nos primeiros vislumbres da História, encontramos os celtas
estabelecidos em boa parte da Europa.
De onde
vieram? Qual foi o lugar de sua origem? Certos historiadores colocam o berço da
sua raça nas montanhas de Taurus, no centro da Ásia Menor, nas vizinhanças dos caldeus. Quando a população
aumentou, eles teriam transposto o Pont-Euxin (no Mar Negro) e penetrado
até à parte central da Europa. Mas, nos nossos dias, essa teoria parece
ter caído em desuso, ocorrendo o mesmo com a hipótese dos arianos.
Camille Jullian, do
Colégio de França, na sua obra mais recente sobre a Histoire de la
Gaule, contenta-se em fixar entre 600 e 800 a.C. a chegada à Gália dos
“kymris”, o ramo mais moderno dos celtas. Eles vinham, crê-se, da foz do Rio
Elba e das costas da Jutlândia,
enxotados por maremotos, o que os obrigou a emigrar em direcção ao sul.
Chegados à
Gália, encontraram um ramo mais antigo dos celtas, os gaélicos, que ali se
achavam fixados desde há muito tempo e que eram de estatura menor, geralmente
morenos, enquanto que os “kymris” eram altos e louros. Essas diferenças são
ainda sensíveis na Armorique,
onde as costas do oceano, no Morbihan, são povoadas de
homens pequenos e morenos, misturados com elementos estrangeiros, atlantes ou
bascos, que se fundiram com as populações primitivas. Nas Costas do Norte
(Côtes-du-Nord) ou na Mancha os habitantes eram de estatura mais alta, aos
quais se vieram juntar os celta-bretões expulsos da grande ilha pelas invasões
dos anglo-saxões.
Os considerandos
de C. Jullian se acham confirmados pelo parentesco das línguas célticas e
germânicas, semelhantes pela sua estrutura, pelos sons guturais, abuso de
letras duras como o K, o W, etc.
No meio das
correntes migratórias, que se cruzam e se entrecruzam na noite da pré-história,
a Ciência acha um processo mais seguro nos estudos linguísticos para
reconstituir a filiação das raças humanas. (i)
(i) D’Arbois
de Jubainville, no seu curso do Colégio de França, por vezes, se dedicava a
uma demonstração no quadro-negro a fim de estabelecer o grau de parentesco das
línguas indo-europeias. Ele pegava uma palavra que traduzia em gaélico, em
alemão, em russo, em sânscrito, em grego, em latim, e descobria que, sob
aquelas diferentes traduções, essa palavra tinha uma mesma raiz.
Daremos
apenas um resumo da história dos gauleses. Sabe-se que os nossos antepassados,
durante séculos, encheram o mundo com o barulho das suas armas. Ávidos de
aventuras, de glórias e de combates, eles não podiam resignar-se a uma vida
apagada e tranquila e iam para a morte como a uma festa, tal era a sua certeza
do Além.
Conhecem-se
as suas numerosas incursões na Itália, na Espanha, na Alemanha e até no
Oriente. Os gauleses invadiam regiões vizinhas e, pela lei de choque e retorno,
sofreram invasões e foram reduzidos à impotência.
A alma da Gália encontra-se nas
instituições druídicas e bárdicas. Os druidas não eram somente os
sacerdotes, mas também os filósofos, os sábios, os educadores da juventude. Os ovates presidiam as
cerimónias do culto e os bardos consagravam-se à poesia e à música.
Mais
adiante exporemos o que era a obra e o verdadeiro carácter do Druidismo.
No início da nossa era, os
romanos já tinham penetrado na Gália, escalado o vale do Rhône e, após terem
ocupado Lyon, avançaram até ao coração do país.
Os gauleses
resistiram com energia e provocaram, por vezes, rudes reveses aos seus
inimigos; entretanto, eles estavam divididos e não ofereciam, amiúde, mais do
que resistências locais. A sua coragem, levada até à temeridade, e o seu
desprezo pelas astúcias guerreiras e pela morte tornavam-se uma desvantagem
para eles.
Combatiam
em desordem, nus até à cintura, com armas mal preparadas, contra adversários
cobertos de ferro, astuciosos e desleais, fortemente disciplinados e
abastecidos de materiais considerável para a época.
Vercingétorix, o
grande chefe arverno,
sustentado pelo poderio dos druidas, conseguiu, certa vez, sublevar toda a
Gália contra César,
e uma luta grandiosa teve lugar. (ii) Educado pelos bardos,
Vercingétorix tinha em parte as qualidades que se impõem à admiração dos homens
e os levam à obediência e ao respeito. O seu amor pela Gália aumentava com o
progresso crescente dos exércitos romanos.
(ii) Arverno – indivíduo dos arvernos (formação latina
“arvernil”), povo da Gália Central ou Gália Céltica que habitava a região
montanhosa (Puy de Dôme, Mont-Dore e Cantal) hoje denominada Auvergne, uma
antiga província francesa. (Nota da Revisora. As suas notas subsequentes
conterão apenas as iniciais N.R.)
Que
diferença entre Vercingétorix e César! O herói gaulês, cheio de fé na
potência invisível que governa os mundos, sustentado pela sua crença
nas vidas futuras, tinha por regra de conduta o dever, por ideal a grandeza e a
liberdade de seu país.
César,
profundamente céptico, só acreditava na fortuna. Tudo nesse homem
era astúcia e cálculo; uma sede intensa de dominação o devorava. Após uma vida
de excessos, crivado de dívidas, ele veio à Gália procurar na guerra os meios
de elevar os seus créditos. Ele cobiçava de preferência as cidades ricas e,
após tê-las entregues à pilhagem, viam-se longos comboios encaminharem-se para
a Itália, levando ouro gaulês aos credores de César.
É
necessário lembrar que, em nome do patriotismo, César perjurou, negou as
liberdades romanas e oprimiu o seu país. Certamente não negaremos o génio
político e militar de César, mas devemos, na verdade, lembrar que esse
génio era marcado por vícios vergonhosos.
E é nos
escritos desse inimigo da Gália que se vai sempre procurar a verdade histórica!
É nos seus Comentários, escritos sob a inspiração do ódio, com a
intenção evidente de se realçar aos olhos dos seus concidadãos, que se estuda a
história da guerra das Gálias. Mas, dois autores romanos, Pollion e Suetônio, confessam que
essa obra está cheia de inexactidões, de erros voluntários.
Em resumo, os gauleses, ardentes, entusiastas, impressionáveis, tinham-se
beneficiado da corrente céltica, dessa grande corrente, veículo das altas
inspirações, que, desde os primeiros tempos, tinham influenciado todo o
nordeste da Europa. Eles foram impregnados pelos eflúvios magnéticos do
solo, desses elementos que, em todas as regiões da Terra, caracterizam e
diferenciam as raças humanas. (iii)
(iii) Ver, no capítulo XIII, no fim desta obra, as mensagens números 5 e 6,
de Allan Kardec.
Mas o seu
ardor juvenil, a sua paixão pelas armas e pelos combates os tinham levado muito
longe, e as perturbações causadas à ordem e à marcha regular das coisas
retornaram pesadamente sobre eles, em virtude dessa lei soberana que reconduz
aos indivíduos, como aos povos, todas as consequências das obras que eles
executaram. Porque tudo o que fazemos pesa sobre nós, através dos
tempos, na forma de chuvas ou de raios, de alegrias ou de dores, e a dor não é
o agente menos eficaz da educação das almas e da evolução das sociedades.
/...
LÉON DENIS, O Génio Céltico e o Mundo Invisível, Primeira Parte OS
PAÍSES CÉLTICOS, CAPÍTULO I – Origem dos celtas. Guerra dos gauleses. Decadência
e queda. Longa noite; o despertar. O movimento pancéltico 1º fragmento da obra.
(imagem de ilustração: The
Apotheosis of the French Heroes who Died for their Country During the War for
Freedom_1802, pintura de Anne-Luis
GIRODET-TRIOSON)
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