Coincidências Ideológicas com Giuseppe Garibaldi e
Giuseppe Mazzini ~
Todo o vocabulário filosófico de Victor Hugo se
assemelha a esse tom dramático que possuem as comunicações mediúnicas. Se se
fizesse um estudo das melhores páginas que constituem a literatura mediúnica,
ver-se-ia que elas possuem o mesmo estilo do grande poeta francês. O vate
de Jersey parecia
estar continuamente em transe mediúnico. Por isso a sua doutrina é a do
infinito, onde o Ser se mostra como uma partícula divina que electriza a
essência cósmica e universal. Mensagens psicografadas como as que apresenta um
livro intitulado "Símbolo ou o túmulo fala" (*),
corroboram o que dissemos. Há nessa obra mediúnica páginas de um dramatismo
espiritual que fazem pensar no estilo victorhugueano.
É que no invisível está o mundo das almas onde o grande e majestoso tem as suas
raízes.
De facto, a literatura mediúnica não é convencional nem fictícia; pelo
contrário, brota dos abismos profundos do invisível, das mesmas raízes do
imaterial, onde o génio só pode falar a linguagem do eterno. O poeta
concebia na sua cosmogonia um homem imortal e predestinado e, como ele
dizia, sábio, visionário, pensador, taumaturgo, navegante, arquitecto, mago,
legislador, filósofo, herói, poeta. Da sua ideologia espiritual e poética
se desprendia a mesma teleologia existencial da codificação de Allan Kardec. A
ideia do progresso infinito habitava no pensamento de Victor Hugo, pois a alma
era para ele um ser que vem ao mundo pela enésima vez e não uma
entidade biológica criada no instante da concepção. Sempre pressentiu
que uma misteriosa pré-existência rege o destino do espírito; por isso
perguntava: "Quem tem incubada essa águia? O abismo incubando o génio?
Existe maior enigma? Terão visto outros mundos as grandes almas que
transitoriamente se adaptam à terra? Chegarão alguns por isso com tantas
intuições?"
Assim; pois, pressentia que o mistério histórico está
entretecido pelos seres espirituais que lhes dão características pessoais a seu
tempo. O seu génio se atirava frente a esses seres mecânicos e vazios quando
negavam a pré-existência dos espíritos. A defesa que fazia da pedra, do burro,
da flor e do anjo era baseada na unidade espiritual da criação. O
pensamento de Deus estava para Victor Hugo em tudo o que existe, por isso, nada
e ninguém estaria excluído do grande desenvolvimento da história natural e
divina. A sua cosmovisão filosófica e religiosa respondia ao que lhe
transmitiram os espíritos desencarnados durante o seu desterro na ilha de
Jersey, ou seja, desde que a Sra. E. de Girardin (Delphine
Gay) o iniciara nas revelações dos tripés mediúnicos.
O seu trabalho poético e literário deixou de ser um
artifício intranscendente, como acontece quando se escreve sem uma
visão espiritual da vida. A obra de Victor Hugo, por suas raízes
aprofundadas no eterno, foi uma defesa do homem ao considerá-lo como um
espírito reencarnado na terra. A sua criação poética se colocou ao lado da
maior revelação dos tempos modernos; por isso, disse: ''O Espiritismo é o
acontecimento mais notável do século XIX". Coincidiu assim com Giuseppe
Garibaldi, que afirmou: "Esta religião da verdade e da ciência se
chama Espiritismo''. O seu pensamento também se relacionou com Giuseppe
Mazzini, que escreveu uma página admirável para definir a missão da
Doutrina Espírita. Ela segue transcrita na íntegra para conhecimento do leitor.
''O Espiritismo científico, isto é, a alma humana
analisada experimentalmente nas suas propriedades e manifestações dará tão
inesperados conhecimentos aos estudos, que perante eles quedarão atónitos,
abismados e se derrubarão todos os humanos edifícios políticos e morais que até
ao presente têm dominado.
"Pela aplicação prática da resultante do estudo do
Espiritismo, uma nova ética, pura, regenerada, potente surgirá da
natureza. Será o potentíssimo credo que fará morrer as mais arraigadas
instituições político-religiosas que reinam sobre a terra:
"Por uma maior e mais disciplinada apreciação das leis
que regem o universo, mudará completamente a orientação da ciência e o
barulho inevitável que isso haverá de produzir afectará todas as manifestações
da vida, que, então, se explicarão pela razão do maior, do mais santo dos
conceitos: o do dever.
"É isto que suporta o Espiritismo. A luta será
áspera, fatigante; mas a consequência será inevitável. De que valerá o conluio
contrário de todos os animais daninhos da terra: o mais forte, indomável
Vetro avança a passos largos, saturado da sabedoria e da fé dos sábios e dos
heróis de todas as épocas e, com os fulgores da ciência positiva caçará as
feras até nas profundezas do seu mundo interior.
''Então soprará sobre a terra as auras da paz, de
gozo; do peito dos homens surgirá espontâneo um hino de louvor, de amor a
Deus; a humanidade, perdendo o último vestígio animal que possui, voltará qual
nascente mariposa, bela e pura, à conquista das mais excelsas regiões, das
puras esferas. " (**)
Nestes mesmos pensamentos de Giuseppe Mazzini assentava o
sentir filosófico de Victor Hugo quanto ao valor histórico e social da
filosofia espírita. Esse mesmo sentir fez falar também outros pensadores como Emilio
Castelar, José Pi y Margall, Camille
Flammarion, Abrahan Lincoln, Victorien
Sardou e outros mais, que eram solidários com a missão espiritual dos
fenómenos mediúnicos. Sem dúvida, fez-se silêncio sobre o sentimento
espírita de Victor Hugo, mas, nessa negação, nessa oposição sistemática é
que está a origem do desastre espiritual da humanidade. Se, por um
lado, querem negar que a alma é imortal, por outro, os que nela crêem
negam que a alma imortal possa comunicar-se com os homens por razões já
insustentáveis e que não vamos considerar aqui. Mas o certo é que
somente pelo fenómeno mediúnico, como manifestação do espírito imortal é que a
razão humana se inclinará reverente a Deus. Por isso, Victor Hugo aceitou o
Espiritismo como mensagem salvadora para o Homem, a Verdade e a Beleza.
/…
(*) Obra editada em Paris, em 1933.
(**) Revista Lumen, Tarrasa, Espanha, 1905. N. do Autor.
Humberto Mariotti, Victor Hugo Espírita,
COINCIDÊNCIAS IDEOLÓGICAS COM GIUSEPPE GARIBALDI E GIUSEPPE MAZZINI, 10º
fragmento da obra.