As famílias químicas ~
Procedendo à análise de todas as substâncias terrestres,
chegaram os químicos a reconhecê-las devidas a inúmeras combinações de cerca (*) de 70 corpos simples, Isto é, de 70
elementos que se não puderam decompor. Fora, pois, de supor-se que há tantas
matérias entre si diferentes, quantos corpos simples. Pura ilusão haveria aí,
devido à nossa impotência para reduzir esses corpos a uma matéria uniforme, que
então lhes seria a base. É o que pensavam Proust e Dumas, quando, no
começo do século, procuravam descobrir, por meio da lei das proporções
definidas, qual seria a substância única, isto é, aquela de que fossem
múltiplos exactos os elementos dos corpos primários. Dumas chegou a mostrar que
não é o hidrogénio, como então se acreditava, mas uma substância ainda
desconhecida, cujo equivalente, em vez de ser a unidade, seria a metade desta:
0,5.
Os físicos partidários da teoria do éter – e hoje são todos
– vão ainda mais longe do que os químicos. A matéria desconhecida, pela mesma
razão de ter por equivalente 0,5, seria ponderável, até para os instrumentos de
que o homem dispõe. Ora, o éter, que enche o Universo, é imponderável; donde se
segue que a substância hipotética dos químicos, a ter por peso metade do hidrogénio,
seria, quando muito, uma das primeiras condensações ou um dos primeiros
agrupamentos do éter. Assim, pois, seria o éter, segundo os físicos, a matéria
única constitutiva de todos os corpos.
“O estudo da luz e da electricidade – diz Angelo Secchi –, nos
há levado a considerar infinitamente provável que e éter mais não é do que a
própria matéria, chegada ao mais alto grau de tenuidade, a esse estado de
rarefacção extrema a que se chama estado atómico. Consequentemente, todos os
corpos seriam apenas agregados dos próprios átomos desse fluido.” (**)
Estas maneiras teóricas de ver se originam dos seguintes
factos químicos:
1º) nos corpos simples existem verdadeiras famílias
naturais;
2º) um grupo composto, cujos elementos se conheçam, pode
desempenhar o papel de um corpo simples; um corpo dito simples pode ser
decomposto;
3º) corpos formados exactamente dos mesmos elementos, reunidos estes, nas
mesmas proporções, têm, entretanto, propriedades diferentes;
4º) a análise espectral revela a existência primitiva de uma
só substância nas estrelas mais quentes, em geral o hidrogénio.
Examinemos rapidamente tão interessantes factos.
Se atentarmos nos diferentes corpos simples,
convencer-nos-emos de que não são de ordem fundamental as suas divergências,
visto que eles podem agrupar-se em séries de famílias naturais. Essa divisão,
fundada em analogias manifestas que alguns deles apresentam, uns com relação
aos outros, oferece uma vantagem que se não pode negar, porquanto, feito estudo
profundo do corpo mais importante, a história dos outros, salvo questões de
detalhes, se deduz naturalmente desse estudo. A semelhança na maneira de se comportarem
mostra que essas matérias apresentam analogias de composição e, portanto, que
elas não são tão dessemelhantes quanto pareciam à primeira vista.
Não lhes é peculiar a individualidade que apresentam os
corpos simples. Há corpos compostos, como o cianogénio – formado pela
combinação do carbono com o azoto –, que, nas reacções, desempenham o papel de
um corpo simples. É claro que, se não houvesse podido separar os elementos
constituintes do cianogénio, também ele houvera sido classificado entre os
corpos simples. Aliás, com os métodos aperfeiçoados da ciência, tais como a
análise espectral, já se pode saber que o ferro, por exemplo, é formado de
elementos mais simples, embora ainda não se haja conseguido isolar estes
últimos. Mas, o que não se conseguiu com relação ao ferro, William Crookes realizou
com referência ao ítrio. Podemos, pois, prever próxima a época em que
desaparecerá a demarcação entre os corpos simples. O mesmo poder de análise,
que limitou a inumerável multidão das substâncias naturais, minerais, vegetais
e animais, a alguns elementos apenas, certamente nos conduzirá à
descoberta da matéria única de onde todas as outras derivam.
Os fenómenos da alotropia e da isomeria justificam essa
expectativa.
/…
(*) Ainda não está definitivamente determinado o número dos
corpos simples. Todos os dias, com efeito, se descobrem novos, principalmente
no estado gasoso: o argónio, o metargónio, o criptónio,
o zenónio, o neónio, etc.
(**) Unidade das forças físicas, pág. 604.
Gabriel Delanne, A Alma é Imortal, Terceira
parte – O Espiritismo e a ciência Capítulo II O tempo, o espaço, a matéria
primordial, O estado molecular – As famílias químicas,
7º fragmento da obra.
(imagem: Pitágoras, pormenor d'A escola de
Atenas de Rafael
Sanzio (1509)
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