~~~ A Terceira Revelação
A primeira revelação estava personificada em Moisés, a segunda em Cristo e
a terceira não o está em nenhum indivíduo. As duas primeiras são
individuais, a terceira é colectiva; reside nisso uma característica
essencial de grande importância. É que ninguém, por consequência, se pode
afirmar seu profeta exclusivo. Foi feita simultaneamente em toda a Terra,
a milhões de pessoas, de todas as idades e de todas as condições, desde o mais
baixo ao mais elevado da escala, consoante a profecia relatada pelo autor dos
Actos dos Apóstolos: «E nos últimos dias acontecerá, diz Deus, que do
meu Espírito derramarei sobre toda a carne; e os vossos filhos e as vossas
filhas profetizarão, os vossos mancebos terão visões e os vossos velhos
sonharão sonhos; / E também do meu Espírito derramarei sobre o meu servo e
minhas servas, naqueles dias, e profetizarão.» (Actos dos Apóstolos,
2: 17, 18.) Não saiu de nenhum culto especial para servir um dia de
ponto de encontro a todos. (*)
(*) O nosso papel pessoal no grande movimento das
ideias que se prepara através do Espiritismo e
que começa a acontecer, é o de observador atento que estuda os
factos para daí retirar as consequências. Confrontámos todos os
que nos foi possível reunir; comparámos e comentámos as instruções
dadas pelos Espíritos em todos os pontos do globo; depois, coordenámos
tudo metodicamente; numa palavra, estudámos e demos a saber ao público o
fruto das nossas investigações sem atribuir ao nosso trabalho outro valor que o
de uma obra filosófica deduzida da observação e da
experiência, sem nunca nos termos dado ares de chefe de doutrina, nem ter
querido impor as nossas ideias a ninguém. Ao publicá-las, usámos de um direito
comum e os que as aceitaram fizeram-no livremente. Se estas ideias encontraram
numerosas simpatias, é por terem tido a vantagem de corresponder às aspirações
de um grande número, com o que não nos podemos envaidecer, pois a sua origem
não nos pertence. O nosso maior mérito é o da perseverança e
devoção à causa que abraçamos. Em tudo isto fizemos o que outros
podiam ter feito; é por isso que nunca tivemos a pretensão de nos julgarmos
profetas ou messias e ainda menos apresentarmo-nos por tal. (N. do A.)
Sendo as duas primeiras revelações produto de um
ensinamento pessoal, foram forçosamente localizadas. Isso quer dizer que
tiveram lugar num só ponto, à volta do qual a ideia se foi expandindo de uns
para os outros; mas foram precisos muitos séculos para que atingissem os
extremos do mundo, mesmo sem o invadirem por completo. A terceira tem isso de
particular; não sendo personificada num indivíduo, produziu-se simultaneamente
em milhares de pontos diferentes e todos se tornaram centros ou focos de
irradiação. Ao multiplicarem-se estes centros, a sua radiação
une-se a pouco e pouco, como os círculos formados por uma quantidade de
pedras atiradas à água; de tal maneira que, em determinada altura, acabarão
por cobrir a superfície total do globo.
É esta uma das causas da rápida propagação da
doutrina. Se tivesse surgido num só ponto, se tivesse sido obra exclusiva de um
homem, teria formado uma seita à sua volta; mas meio século teria talvez
decorrido antes de ter atingido os limites do país onde tivesse nascido,
enquanto que assim, dez anos depois, tem rebentos implantados de um pólo ao
outro.
Esta circunstância, espantosa na história das
doutrinas, confere a esta uma força excepcional e uma força de acção
irresistível; com efeito, se a comprimirmos num ponto, num país, é
materialmente impossível comprimi-la em todos os pontos, em todos os países.
Por cada sítio onde seja reprimida, haverá mil ao lado onde florescerá. Ainda
mais, se a extinguirmos num indivíduo, não podemos extingui-la nos Espíritos,
que são dela a fonte. Ora, como os Espíritos estão em todo o lado e porque
sempre existirão, se, por impossível, se conseguisse abafá-la em todo o globo,
ela reapareceria algum tempo depois, porque assenta sobre um facto, facto
esse que está na natureza, e não podemos suprimir as leis da natureza. É
disto que se devem então convencer os que sonharam com a aniquilação do
Espiritismo. (Revista Espírita, Fevereiro de 1865, p. 38: Perpetuidade
do Espiritismo.)
No entanto, estes centros disseminados deveriam
permanecer ainda algum tempo isolados uns dos outros, confinados como alguns
estão a países longínquos. Era necessário entre eles um traço de união que os
colocasse em comunhão de pensamento com os seus irmãos de doutrina,
ensinando-lhes o que se fazia noutros lugares. Este traço de união, que
terá faltado ao Espiritismo na antiguidade, encontra-se nas publicações
que chegam a todo o lado, que condensam numa forma única, concisa e
metódica, os ensinamentos dados em todos os sítios sob múltiplas formas e em
diversas línguas.
/…
ALLAN KARDEC, A GÉNESE – Os Milagres e as Profecias Segundo o
Espiritismo, Capítulo I NATUREZA DA REVELAÇÃO ESPÍRITA números de 45
a 48 (IX), 11º fragmento desta obra. Tradução portuguesa de Maria Manuel
Tinoco, Editores Livros de Vida.
(imagem de contextualização: Diógenes e
os pássaros de pedra, pintura em acrílico de Costa Brites)
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