segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

pensamento e vontade ~


Ideoplastia ~
 
(II

Por sua vez, a srta. Felicia Scatcherd assim se refere à atitude do ectoplasma, no decurso de uma das suas numerosas sessões: 

“Almoçamos com Marta (Eva C...) e, quando terminamos o almoço, ela manifestou o desejo de me proporcionar uma sessão. Resistia-lhe ao propósito, com receio de a fatigar, mas, foi por sua insistência, que a Sra. Bisson acabou intervindo e opinando que seria melhor não lhe contrariar os desejos. Iniciado o trabalho, a médium caiu logo em profundo transe, cabeça pendida para trás, de modo que nada lhe seria possível perceber na sua frente, ainda que acordada estivesse. Abertas ficaram as cortinas do gabinete mediúnico, cuja luz baixamos um pouco. Ainda estávamos a conversar, quando, de repente, vimos aparecer no chão abundante massa de substância, a cerca de 18 polegadas de distante e à esquerda da cadeira da médium. 

Essa substância era de alvura extraordinária e ligeiramente luminosa. 

Para comigo, pensei: “Como se pode produzir semelhante coisa? Quem sabe se essa substância está ligada à médium?” 

E o controle da médium logo respondeu à minha pergunta mental, dizendo: “Não há ligações quaisquer; pode passar a mão entre a substância e o corpo da médium.” 

Assim fiz, sem inconvenientes. 

Depois, coloquei um lenço branco, perfeitamente limpo, ao lado da substância, a fim de lhe avaliar a alvura e verifiquei que o lenço me parecia antes cinzento, comparado com a substância misteriosa. 

Coloquei-me, depois, de modo a poder tocar a substância sem ser vista, mas, quando estava a ponto de o fazer, todo o corpo da médium se contorceu em convulsivo espasmo e, o controle exclamou: 

– “Não me toque, não me toque, porque me mataria!” 

Arrependida da tentativa inconsiderada, humildemente procurei desculpar-me. 

Todavia, mais tarde, espontaneamente me autorizaram esse toque e, assim constatei que essa substância oferece certa resistência ao tacto, comparável à clara de ovo

E quanto à sua temperatura, pareceu-me um pouco inferior à do ambiente em que nos encontrávamos. 

Seria interessante pesar essa substância, disse eu à Sra. Bisson, mas compreendo, ao mesmo tempo, que se nos torna impossível fazê-lo, uma vez que o seu manuseio pode prejudicar a médium. 

Sorriu-se a Sra. Bisson e, dirigindo-se à filha, pediu-lhe que fosse à cozinha buscar uma balança. 

Entretanto, a mágica substância alongou-se, tomou a forma de um réptil, donde, concluo houvesse compreendido o que dela pretendíamos. 

Chegada a balança, foi-me dado experimentar uma das mais fortes emoções da minha vida

É que a substância, qual serpente que se levantasse sobre a cauda, viera colocar-se num dos pratos da balança, que estava sobre um pedestal, à altura de 28 centímetros do chão. 

E ali permaneceu todo o tempo necessário à verificação do seu peso, por mim julgado levíssimo, em relação ao volume. 

Serpeando depois para trás, deixou o prato e baixou ao soalho, para retomar o primitivo aspecto informe. 

Depois, enquanto a observava, sumiu-se. Não se retraiu, não se dissolveu; simplesmente – desapareceu.” (Light, 1921, págs. 809-810). 

Seria inútil perdermo-nos em conjecturas sobre a natureza dessa substância viva, sensível, inteligente, capaz de aparecer e desaparecer num relâmpago, pois isso equivaleria a pretendermos explicar o mistério da vida, que é segredo de Deus. 

Contentemo-nos em registar o que ressalta da nossa mentalidade finita, à qual não é lícito ultrapassar as leis reguladoras dos fenómenos. 

Limitar-me-ei, portanto, a anotar que, neste caso, tudo contribui para demonstrar que a substância viva, exteriorizada, obedece à vontade do subconsciente do médium

Daí, importa inferir que, da mesma forma pela qual, graças à vontade do médium, essa substância consegue moldar-se à forma de réptil para alçar-se a balanças e deixar-se pesar, assim também, noutras circunstâncias, ela consegue moldar semblantes humanos, conhecidos do médium, como a demonstrar que o pensamento e a vontade subconscientes são, precisamente, forças plásticas e organizadoras. 

Mas isto não é tudo, porquanto, ensinando-nos outras experiências que, muitas vezes, os semblantes materializados são desconhecidos do médium, embora o sejam dos assistentes, conclui-se que a substância viva é capaz de obedecer à vontade subconsciente de terceiras pessoas presentes, ou de lhes sofrer a influência, através do médium. 

Finalmente, como noutras circunstâncias ocorrem, nas quais as formas materializadas, vivas e falantes, são pessoas já falecidas e desconhecidas do médium e dos assistentes, devemos deduzir que a substância viva exteriorizada é susceptível de obedecer a entidades espirituais de desencarnados, ou – o que vem a dar no mesmo – de sofrer-lhes as influências através do médium. 

Posto isto, convém nunca perder de vista as conclusões expostas, mediante as quais constatamos que, se é verdade que a substância viva, exteriorizada, obedece a uma força organizadora inerente ao pensamento e vontade humana, também é verdade que tais – pensamento e vontade – não pertencem exclusivamente à personalidade integral subconsciente do médiummas provêm, algumas vezes, dos experimentadores e, muitas outras vezes, de entidades espirituais, de criaturas falecidas. 

Desta terceira categoria de manifestações não me ocuparei, visto que o tema aqui versado se prende aos casos em que a vontade organizadora é a do médium e dos assistentes, ou seja, dos vivos. 

Resta-me, apenas, passar em revista alguns casos mais importantes desse género. 

Começo por assinalar um fenómeno curioso, contra a realização do qual importa saibam prevenir-se os experimentadores. 

Esse fenómeno decorre da ductilidade com a qual a mentalidade subconsciente do médium de materializações absorve as ideias nitidamente definidas, formuladas verbal e mesmo mentalmente pelos experimentadores e pelos circunstantes. 

Assim se constata que, se o experimentador imagina uma teoria a priori, mais ou menos mecânica e mediante a qual se opera um dado fenómeno físico, vê-la-á confirmada a posteriori

Terá ele, então, a ilusão de haver sido instruído da verdade, quando realmente mais não fez que sugestionar o médium, predispondo-o a reproduzir, com a substância ectoplásmica, o modelo concreto da sua própria teoria. 

Assim, por exemplo, o Dr. Crawford, professor de mecânica psíquica, tendo imaginado a priori que as levitações da mesa se davam graças a uma “alavanca fluídica” que, saindo do organismo do médium, descia até ao chão para distender-se depois em braço vertical que tocasse o fundo da mesa e a levantasse, teve a surpresa de verificar que as provas fotográficas dessas levitações lhe davam absoluta razão, isto é: a tal “alavanca fluídica” existia, de facto, constituída pela forma imaginada. 

Mas, essa verificação de um facto não significava de modo nenhum que as levitações de mesa, em geral, se operassem dessa maneira, pois na verdade era a vontade subconsciente do médium que, tendo agasalhado a sugestão verbal de Crawford, lhe proporcionara docilmente a “alavanca” por ele pressuposta. 

Esta explicação do fenómeno em apreço já ninguém mais recusa, nem dela duvida. 

Dá-se, em suma, com as materializações, a mesma coisa que já se dera com o hipnotismo, a respeito do qual os primeiros investigadores científicos, inclusive o eminente Charcot, tinham nitidamente formulado, baseando-se em factos, as leis da sugestão e as fases específicas do sono letárgico e cataléptico dos pacientes; leis e fases que, na realidade, mais não eram que a consequência sugestiva das ideias teóricas preconcebidas pelos diferentes hipnotizadores. 

É o que observamos actualmente a propósito do polimorfismo da substância ectoplásmica exteriorizada, que pode por sugestão ou auto-sugestão revestir todas as formas imagináveis. 

Daí resulta que os experimentadores devem manter-se em condições mentais absolutamente neutras, no que toca às modalidades das representações materializadas, deixando aos processos científicos da análise comparada e da convergência das provas a tarefa difícil de esclarecer o grande mistério. 

/… 


Ernesto BozzanoPensamento e Vontade – Ideoplastia (2 de 3), 10º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: A Female Saint_1941, pintura de Edgard Maxence)

Sem comentários:

Enviar um comentário