(II)
Por sua vez, a srta. Felicia
Scatcherd assim se refere à atitude do ectoplasma,
no decurso de uma das suas numerosas sessões:
“Almoçamos com Marta (Eva C...) e, quando terminamos o almoço, ela manifestou o desejo de me
proporcionar uma sessão. Resistia-lhe ao propósito, com receio de a fatigar, mas, foi por sua insistência, que a Sra. Bisson acabou intervindo e opinando que seria melhor não lhe contrariar os desejos. Iniciado o trabalho, a médium
caiu logo em profundo transe, cabeça pendida para trás, de modo que nada lhe
seria possível perceber na sua frente, ainda que acordada estivesse. Abertas
ficaram as cortinas do gabinete mediúnico, cuja luz baixamos um pouco. Ainda
estávamos a conversar, quando, de repente, vimos aparecer no chão abundante
massa de substância, a cerca de 18 polegadas de distante e à
esquerda da cadeira da médium.
Essa substância era de alvura extraordinária e ligeiramente luminosa.
Para comigo, pensei: “Como se pode produzir semelhante coisa? Quem sabe se essa
substância está ligada à médium?”
E o controle da médium logo respondeu à minha
pergunta mental, dizendo: “Não há ligações quaisquer; pode passar a mão
entre a substância e o corpo da médium.”
Assim fiz, sem inconvenientes.
Depois, coloquei um lenço branco, perfeitamente limpo, ao
lado da substância, a fim de lhe avaliar a alvura e verifiquei que o lenço me
parecia antes cinzento, comparado com a substância misteriosa.
Coloquei-me, depois, de modo a poder tocar a
substância sem ser vista, mas, quando estava a ponto de o fazer, todo o
corpo da médium se contorceu em convulsivo espasmo e, o controle exclamou:
– “Não me toque, não me toque, porque me mataria!”
Arrependida da tentativa inconsiderada, humildemente
procurei desculpar-me.
Todavia, mais tarde, espontaneamente me autorizaram esse
toque e, assim constatei que essa substância oferece certa resistência ao
tacto, comparável à clara de ovo.
E quanto à sua temperatura, pareceu-me um pouco inferior à
do ambiente em que nos encontrávamos.
Seria interessante pesar essa substância, disse eu à Sra.
Bisson, mas compreendo, ao mesmo tempo, que se nos torna impossível fazê-lo,
uma vez que o seu manuseio pode prejudicar a médium.
Sorriu-se a Sra. Bisson e, dirigindo-se à filha, pediu-lhe
que fosse à cozinha buscar uma balança.
Entretanto, a mágica substância alongou-se, tomou
a forma de um réptil, donde, concluo houvesse compreendido o que dela
pretendíamos.
Chegada a balança, foi-me dado experimentar uma
das mais fortes emoções da minha vida.
É que a substância, qual serpente que se
levantasse sobre a cauda, viera colocar-se num dos pratos da balança,
que estava sobre um pedestal, à altura de 28 centímetros do chão.
E ali permaneceu todo o tempo necessário à verificação do
seu peso, por mim julgado levíssimo, em relação ao volume.
Serpeando depois para trás, deixou o prato e baixou ao
soalho, para retomar o primitivo aspecto informe.
Depois, enquanto a observava, sumiu-se. Não se retraiu, não
se dissolveu; simplesmente – desapareceu.” (Light, 1921, págs. 809-810).
Seria inútil perdermo-nos em conjecturas sobre a natureza
dessa substância viva, sensível, inteligente, capaz de aparecer e desaparecer
num relâmpago, pois isso equivaleria a pretendermos explicar o
mistério da vida, que é segredo de Deus.
Contentemo-nos em registar o que ressalta da nossa
mentalidade finita, à qual não é lícito ultrapassar as leis reguladoras dos
fenómenos.
Limitar-me-ei, portanto, a anotar que, neste caso, tudo
contribui para demonstrar que a substância viva, exteriorizada, obedece
à vontade do subconsciente do médium.
Daí, importa inferir que, da mesma forma pela qual, graças à
vontade do médium, essa substância consegue moldar-se à forma de réptil para
alçar-se a balanças e deixar-se pesar, assim também, noutras circunstâncias,
ela consegue moldar semblantes humanos, conhecidos do médium, como a
demonstrar que o pensamento e a vontade subconscientes são,
precisamente, forças plásticas e organizadoras.
Mas isto não é tudo, porquanto, ensinando-nos outras
experiências que, muitas vezes, os semblantes materializados são
desconhecidos do médium, embora o sejam dos assistentes, conclui-se que
a substância viva é capaz de obedecer à vontade subconsciente de
terceiras pessoas presentes, ou de lhes sofrer a influência, através do
médium.
Finalmente, como noutras circunstâncias ocorrem,
nas quais as formas materializadas, vivas e falantes, são pessoas já falecidas
e desconhecidas do médium e dos assistentes, devemos deduzir que a
substância viva exteriorizada é susceptível de obedecer a entidades espirituais
de desencarnados, ou – o que vem a dar no mesmo – de sofrer-lhes as influências
através do médium.
Posto isto, convém nunca perder de vista as conclusões
expostas, mediante as quais constatamos que, se é verdade que a substância
viva, exteriorizada, obedece a uma força organizadora inerente ao pensamento e
vontade humana, também é verdade que tais – pensamento e vontade – não
pertencem exclusivamente à personalidade integral subconsciente do
médium, mas provêm, algumas vezes, dos experimentadores e, muitas
outras vezes, de entidades espirituais, de criaturas falecidas.
Desta terceira categoria de manifestações não me ocuparei,
visto que o tema aqui versado se prende aos casos em que a vontade organizadora
é a do médium e dos assistentes, ou seja, dos vivos.
Resta-me, apenas, passar em revista alguns casos mais
importantes desse género.
Começo por assinalar um fenómeno curioso, contra a
realização do qual importa saibam prevenir-se os experimentadores.
Esse fenómeno decorre da ductilidade com a qual a
mentalidade subconsciente do médium de materializações absorve as ideias
nitidamente definidas, formuladas verbal e mesmo mentalmente pelos
experimentadores e pelos circunstantes.
Assim se constata que, se o experimentador imagina uma
teoria a priori, mais ou menos mecânica e mediante a qual se opera
um dado fenómeno físico, vê-la-á confirmada a posteriori.
Terá ele, então, a ilusão de haver sido instruído da
verdade, quando realmente mais não fez que sugestionar o médium,
predispondo-o a reproduzir, com a substância ectoplásmica, o modelo concreto da
sua própria teoria.
Assim, por exemplo, o Dr. Crawford, professor de mecânica psíquica, tendo
imaginado a priori que as levitações da mesa se davam graças a
uma “alavanca fluídica” que, saindo do organismo do médium, descia até ao chão para distender-se depois em braço vertical que tocasse o fundo da mesa e a
levantasse, teve a surpresa de verificar que as provas fotográficas dessas
levitações lhe davam absoluta razão, isto é: a tal “alavanca
fluídica” existia, de facto, constituída pela forma imaginada.
Mas, essa verificação de um facto não significava
de modo nenhum que as levitações de mesa, em geral, se operassem
dessa maneira, pois na verdade era a vontade subconsciente do médium que,
tendo agasalhado a sugestão verbal de Crawford, lhe proporcionara docilmente a
“alavanca” por ele pressuposta.
Esta explicação do fenómeno em apreço já ninguém mais recusa, nem dela duvida.
Dá-se, em suma, com as materializações, a mesma coisa que já
se dera com o hipnotismo, a respeito do qual os primeiros
investigadores científicos, inclusive o eminente Charcot,
tinham nitidamente formulado, baseando-se em factos, as leis da
sugestão e as fases específicas do sono letárgico e cataléptico
dos pacientes; leis e fases que, na realidade, mais não eram que a
consequência sugestiva das ideias teóricas preconcebidas pelos diferentes
hipnotizadores.
É o que observamos actualmente a propósito do polimorfismo da
substância ectoplásmica exteriorizada, que pode por sugestão ou auto-sugestão
revestir todas as formas imagináveis.
Daí resulta que os experimentadores devem manter-se
em condições mentais absolutamente neutras, no que toca às
modalidades das representações materializadas, deixando aos processos
científicos da análise comparada e da convergência das provas a tarefa difícil
de esclarecer o grande mistério.
/…
Ernesto
Bozzano, Pensamento e Vontade – Ideoplastia (2
de 3), 10º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: A Female Saint_1941,
pintura de Edgard Maxence)
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