Alma humana…
Assim se desvenda o mistério da Psique, a alma humana, filha
do céu, presa temporariamente na carne e que volta para a sua pátria de origem
ao longo das milhares de mortes e renascimentos.
A tarefa é árdua e as subidas a escalar são difíceis; a
espiral assustadora a ser percorrida se desenrola sem um término
aparente; mas as nossas forças não possuem limites, pois podemos
renová-las incessantemente pela vontade e pela comunhão universal.
E, depois, não estamos sozinhos para efectuar essa grande
viagem. Não apenas nos reuniremos, cedo ou tarde, com os seres amados, os
companheiros de nossas vidas passadas, aqueles que compartilharam as nossas
alegrias e os nossos tormentos, mas também com os outros grandes seres, que
também foram homens e que agora são espíritos celestes e permanecem a nosso
lado nas passagens difíceis. Aqueles que nos ultrapassaram no caminho
sagrado não se desinteressam da nossa sorte e, quando a tormenta
maltrata a nossa estrada, as suas mãos caridosas sustentam a nossa caminhada.
Lenta e dolorosamente, amadurecemos para as tarefas cada vez
mais elevadas; participamos mais da execução de um plano cuja majestade enche
de uma admiração comovente aquele que nele entrevê as linhas imponentes. À
medida que a nossa ascensão se acentua, maiores revelações nos são feitas,
novas formas de actividade, novos sentidos psíquicos nascem em nós, coisas mais
sublimes nos aparecem. O universo fluídico se mostra sempre mais vasto para o
nosso desenvolvimento; ele se torna uma fonte inesgotável de alegrias
espirituais.
Posteriormente, chega a hora em que, após as suas
peregrinações pelos mundos, a alma, das regiões da vida superior, contempla o
conjunto de suas existências, o longo cortejo dos sofrimentos por que passou.
Esses sofrimentos são o preço da sua felicidade, essas provas redundaram todas
em seu proveito, afinal ela o compreende. Então, mudam-se os papéis. De
protegida passa a protectora; envolve com a sua influência os que lutam
ainda nas terras do espaço, insufla-lhes os conselhos da própria experiência;
sustenta-os na via árdua, nas sendas ásperas que ela própria percorreu.
Conseguirá a alma chegar um dia ao termo de sua viagem?
Avançando pelo caminho traçado, ela vê sempre se abrirem novos campos
de estudos e descobertas. Semelhantes à corrente de um rio, as águas da Ciência
suprema descem para ela em torrente cada vez mais caudalosa. Chega a
penetrar a santa harmonia das coisas, a compreender que não existe nenhuma discordância,
nenhuma contradição no universo; que por toda a parte reinam a ordem, a
sabedoria, a providência e, a sua confiança e o seu entusiasmo aumentam cada
vez mais. Com amor maior ao Poder Supremo, ela saboreia de maneira mais intensa
as felicidades da vida bem-aventurada.
Daí em diante está intimamente associada à obra divina; está
preparada para desempenhar as missões que cabem às almas superiores, à
hierarquia dos Espíritos que, por diversos títulos, governam e animam o
Cosmos, porque essas almas são os agentes de Deus na obra eterna da
Criação, são os livros maravilhosos em que Ele escreveu os seus mais belos
mistérios, são como as correntes que vão levar às terras do espaço as
forças e as radiações da Alma Infinita.
Deus conhece todas as almas, que formou com o seu pensamento
e o seu amor. Sabe o grande partido que delas há de tirar mais tarde para a
realização das suas vistas. A princípio, deixa-as percorrer vagarosamente as
vias sinuosas, subir os sombrios desfiladeiros das vidas terrestres, acumular
pouco a pouco em si os tesouros de paciência, de virtude, de saber, que se
adquirem na escola do sofrimento. Mais tarde, enternecidas pelas chuvas
e pelas rajadas da adversidade, amadurecida pelos raios do sol divino, saem da
sombra dos tempos, da obscuridade das vidas inumeráveis e, eis que as suas
faculdades desabrocham em feixes deslumbrantes; a sua inteligência revela-se em
obras que são como que o reflexo do Génio Divino.
/...
LÉON DENIS, O Problema do Ser, do Destino e da Dor, IX
– Evolução e finalidade da alma, fragmento.
(imagem de contextualização: Head of Divine
Vengeance, pintura de Pierre-Paul Prud'hon)