III – As Lições da Guerra ~
|Março de 1915|
Os terríveis combates entre as nações e as
raças, além das convulsões que sacodem o mundo, produzem os mais sérios
problemas e, em presença desse grande drama, mil questões se apresentam à mente
humana ansiosa, havendo momentos em que a dúvida, a inquietação e o pessimismo
dominam os espíritos mais fortes e decididos.
O progresso será uma vã ilusão? A civilização
ficará submersa no mar das paixões brutais? Os esforços dos séculos em prol da
justiça, da fraternidade e da paz social serão inúteis? As concepções da arte e
do génio do homem, os frutos do pesado e imenso trabalho de milhões de cérebros
e de braços irão desaparecer arrasados pela tormenta?
Esse abismo de desgraças é analisado calmamente
pelo pensador espiritualista e do caos dos acontecimentos ele extrai a
principal lei que rege o Universo.
Acima de tudo, lembra-se de que o nosso mundo é
um planeta inferior, um laboratório onde desabrocham as almas ainda
inexperientes com os seus anseios confusos e as suas paixões desordenadas.
O profundo sentido da vida aparece, para o
pensador espírita, com as duras necessidades que a ela são inerentes; é o
início das qualidades e energias que existem em todos os seres.
A fim de que as energias que
existem desconhecidas e silenciosas nas profundezas da alma apareçam na
superfície, há necessidade de aflições, angústias e lágrimas, porque não existe
grandeza sem sofrimento, nem progresso sem provação.
Se o homem na Terra se desenvencilhasse das
vicissitudes da sorte e ficasse privado das grandes lições do
sofrimento, poderia fortalecer o carácter, desenvolver a experiência ou
valorizar as riquezas ocultas de sua alma?
No mundo, sendo o mal uma fatalidade, não
existirá responsabilidade para os maus?
Seria um erro funesto aceitá-lo, porque o
homem, na sua ignorância e cegueira, semeia o mal, cujas
consequências caem pesadamente sobre ele, assim como sobre todos os que se
associam às suas más acções. É isso que o momento actual comprova.
Dois poderosos imperadores, um
protestante e outro católico, desencadearam a guerra com todos os seus
horrores; fazia meio século que vinham preparando, calculando e combinando tudo
para obter uma vitória esmagadora.
Os poderes espirituais, porém, interferiram no
conflito, inspirando às nações em perigo uma heróica resistência e nelas
fazendo surgir os tesouros do heroísmo que estavam acumulados nas almas célticas e latinas,
desde anteriores existências.
Vejam como se inverteu a situação após seis
meses de lutas. Os alemães faziam uma guerra de conquista, no início da
campanha; hoje estão reduzidos a combater em defesa própria.
Nos momentos de amargura e de incerteza sempre
surge um homem providencial. Neste caso, e para a França, esse homem é o
general Joffre,
que possui as qualidades exigidas pela grave situação do momento!
Ele soube conter no Marne a enorme avalanche
alemã e agora, como comandante sábio e competente, poupando os seus soldados,
prepara, prudentemente, os meios de expulsar o inimigo para além das
fronteiras.
Acima do confuso tumulto das batalhas, além dos
clarões terríveis da carnificina e do incêndio, vislumbra-se uma aurora e um
grandioso ideal começa a se esboçar; pressente-se a obra de moralização
que dimana do sofrimento.
Acima da labareda das paixões
terrenas, sente-se a presença de um tribunal invisível que espera o final do
conflito para reivindicar os direitos da eterna justiça.
Os nossos soldados sentem tais coisas de modo
vago, têm a intuição de que a sua causa é augusta e sagrada, e tal impressão
vai, pouco a pouco, propagando-se por todo o país. Aí se explica por que a
inteligência se tornou mais digna e os sentimentos ficaram mais
graves e profundos.
A borrasca espantou as
futilidades e as leviandades, com tudo quanto era pueril e mundano em que a
nossa geração gostava de se ocupar, deixando permanecer o que havia em nós de
mais sólido e melhor.
/…
LÉON DENIS, O Mundo Invisível e a Guerra, III –
As Lições da Guerra 1 de 3, 6º fragmento da obra.
(imagem: Tanque de guerra britânico capturado pelos
Alemães, durante a Primeira Guerra
Mundial)
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