Sugestão hipnótica e pós-hipnótica |
A imagem mental, sugerida ao paciente em estado de hipnose,
reveste objectivação tão acentuada, que chega a eclipsar objectos reais, ou
ainda a fixar-se com tal firmeza sobre uma folha de papel, que,
cessada a sugestão, o paciente continuará percebendo-a.
Se introduzirmos essa folha de papel num
pacote com outras folhas, absolutamente idênticas, convidando o paciente a
indicá-la, ele o fará sem hesitação nem equívoco.
Binet propôs,
para explicar esta última particularidade, a hipótese do “ponto de referência”.
Supõe ele que, na folha de papel em que se criou a imagem,
se apresente alguma singularidade como, por exemplo, uma insignificante
granulação, que sirva para reconhecê-la e sobre ela projectar a imagem
alucinatória sugerida.
Até certo ponto, esta ideia parece plausível.
Embora muito deixando a desejar, ela constituía, por assim
dizer, a única hipótese mediante a qual podiam os factos ser julgados, enquanto
não possuíamos as recentes e importantes premissas derivadas das experiências
metapsíquicas.
Acredito, contudo, deva ela ser quase por completo
abandonada, para reconhecermos que as diferentes modalidades com que se
apresentam as imagens alucinatórias, no curso das experiências hipnóticas,
tendem a evidenciar a sua natureza objectiva.
Nesse sentido, vamos rapidamente recensear as modalidades
mais significativas.
Quando, à revelia do paciente, viramos o papel em que ele
percebe a imagem alucinatória, apresentando-lho invertido, o paciente também a
vê do mesmo modo invertida, infalivelmente.
Se o convidamos a olhar através de um prisma, dupla lhe
parecerá a imagem, tal como sucede com as imagens reais.
Eis o que diz Binet:
“Quando, durante o sono hipnótico, sugiro à paciente que
sobre a mesa de cor escura, diante dela colocado, está um retrato de perfil,
ela assim o vê quando desperta.
Depois, colocando-lhe, sem a prevenir, um prisma diante dos
olhos, logo se mostra admirada em divisar dois perfis.
E a imagem fictícia se localiza, infalivelmente, de
acordo com as leis físicas...
Assim, se a base do prisma estiver voltada para cima, as
duas imagens se colocarão super-postas; se estiver de lado, a visão será
lateral.
Utilizando um binóculo, a imagem alucinatória aproxima-se ou
afasta-se, conforme se coloque diante dos olhos da paciente a ocular, ou a
objectiva.
O mesmo ocorre se tivermos a precaução de dissimular a
extremidade do binóculo, evitando que os objectivos reais incidam no campo
visual.
Se lhe dermos um espelho, ela aí verá reflectida a imagem
alucinatória.
Assim, por exemplo: sugiro a existência de um objecto
qualquer no canto da mesa, coloco, depois, um espelho por trás do referido
canto e a paciente aí percebe imediatamente dois objectos análogos,
parecendo-lhe o objecto reflectido tão real quanto o alucinatório,
de que é apenas um reflexo.”
Podemos acrescentar que o Dr. Perinaud, chefe da
clínica oftalmológica das enfermidades nervosas, na Salpetrière, demonstrou
que:
“A alucinação de uma cor pode desenvolver fenómenos
de contraste cromático, de maneira idêntica e mesmo mais intensa do que os
produzidos na percepção real da mesma cor.”
Resta-nos, finalmente, assinalar uma prova
fisiológica a favor da substancialidade real das imagens alucinatórias: a
concernente às modificações da pupila dos alucinados.
Nesse sentido, observa o Dr. Féré:
“Eis o que notamos em duas histéricas com as quais
nos foi possível entrar em comunicação verbal, durante o estado cataléptico.
Quando lhes ordenamos acompanhassem o voo de um pássaro, que
pousara em uma cúpula, ou ainda de um outro em pleno espaço, as pupilas
se lhe dilataram até ao dobro do diâmetro normal.
Mas, à proporção que fazíamos baixar o pássaro, elas
se contraíam gradualmente.
Essa experiência pode reproduzir-se à vontade e o fenómeno
se renova infalivelmente, sempre que sugerido às pacientes um novo objecto.
Ora, essas modificações das pupilas, provocadas nos
catalépticos, e que não deixam de apresentar todos os fenómenos característicos
da catalepsia, demonstram
que, na alucinação, o objecto imaginário é visto exactamente como se fosse real,
a provocar, pelo movimento, esforços de acomodação da pupila, de acordo com as
leis que regulam a visão de um objecto real.”
Essas diversas e complexas modalidades pelas quais se
manifestam as alucinações, por sugestão hipnótica, escapam totalmente à órbita
explicativa dos pontos de referência.
Todavia, era inevitável e lógico que psicólogos e
fisiologistas, despercebidos das hodiernas investigações metapsíquicas,
considerassem os factos como de natureza puramente subjectiva, ainda que
essa explicação fosse inconciliável com os mesmos factos.
Agora, é tempo de reconhecermos que, graças às modalidades
características mediante as quais se operam as alucinações em apreço, devem
elas ser consideradas em relação com as “formas do pensamento” entrevistas
pelos sensitivos, com as gravadas em placas fotográficas
ou, ainda, com as que se concretizam e materializam nas sessões mediúnicas.
Tudo contribui, assim, para demonstrar que as
alucinações hipnóticas pertencem à classe das projecções objectivas pelo
pensamento.
/…
Ernesto Bozzano, Pensamento
e Vontade – Sugestão hipnótica e pós-hipnótica, 5º
fragmento da obra.
Sem comentários:
Enviar um comentário