Desenvolvimento da Ciência Espírita ~
É cada vez maior o número de pessoas que recorrem às
instituições espíritas suplicando ajuda para si mesmas ou para parentes e
amigos que se entregam a viciações e perversões de toda a espécie. Na sua
humildade muitas vezes simplória, alimentada racionalmente pelos princípios
doutrinários, os dirigentes de centros e grupos espíritas fazem o que podem,
servindo-se dos recursos naturais da prece, do passe e das
sessões mediúnicas.
Dos resultados positivos obtidos no passado, não obstante as campanhas
difamatórias, perseguições e processos criminais movidos contra os médiuns,
nasceram os Hospitais Psiquiátricos Espíritas, hoje em grande
número no nosso país e geralmente bem aparelhados e dotados de assistência médica especializada.
Só no Estado de São Paulo funcionam actualmente mais de trinta hospitais
espíritas reunidos numa Federação Hospitalar de que o Governo do Estado se
serviu para aliviar o Juqueri, Hospital Franco da Rocha, numa das suas crises mais
ameaçadoras. Os espíritas sentem-se na obrigação de atender a esses casos,
sempre que possível, por considerarem que eles são mais
espirituais do que materiais, de maneira que o tratamento médico é geralmente
insuficiente para curá-los. Fiéis aos princípios de caridade e fraternidade da
Doutrina, esforçam-se por dar a sua ajuda desinteressada em
favor dos sofredores.
Essa intenção piedosa, humanitária, foi constantemente
denegrida por médicos e clérigos desconhecedores do problema. A luta foi sempre
árdua e até mesmo desesperadora para os espíritas, num país em que a maioria da
população é pobre e desprovida de cultura, prevalecendo sempre as opiniões dos
doutores e dos sacerdotes, os primeiros apoiados na sua formação científica e
académica, e os segundos na sua falível cultura religiosa, mais de sacristia do
que de seminário. Essas duas classes gozavam amplamente da autoridade de
saberetas num meio social de analfabetos e bacharéis em direito.
Os espíritas que mais se destacavam pelos seus conhecimentos doutrinários
não haviam sequer compreendido os fundamentos científicos do Espiritismo e os
encaravam misteriosa e até mesmo cabalisticamente. Os adversários não
encontravam dificuldades para misturá-los, aos olhos do público, com possíveis
remanescentes da Goécia ou magia-negra medieval. Padres, bacharéis e juristas
pintaram o chamado demonismo-espírita à moda do tempo, com rabo, chifres e
a foice e o martelo do ateísmo pendurados ao
pescoço.
Quando os espíritas de Amparo resolveram fundar naquela
cidade um Sanatório Espírita para doentes mentais, ilustre, um jovem e fogoso
médico e intelectual paulista explicou pelos jornais da época, nos anos 40, que
os espíritas fundavam esses hospitais por dor de consciência, pois fabricavam
loucos e depois queriam reabilitá-los. Foi necessário que um jornalista
espírita o revidasse, mostrando que o motivo não era esse, mas o facto evidente
da falência da medicina que, no desconhecimento do problema,
enchia diariamente os caldeirões do diabo no Juqueri com pobres criaturas
desprotegidas da ciência e da religião. O mestre implume, não podendo voar
mais alto, teve de calar o bico. Logo mais, o médium Arigó, que por sinal ainda
era católico e fazia milagres ao invés de produzir fenómenos,
foi atacado brutalmente por uma série de artigos publicados num jornal de
grande circulação por um médico que não chegara a ver o médium e diagnosticava
à distância a sua loucura, e por famoso professor universitário que o apoiava,
alegando que Arigó operava sob a acção alucinatória do café, que bebia em
excesso. Os cientistas norte-americanos salvaram o médium
já então condenado à prisão, vindo a São Paulo e expondo, no auditório do Museu
de Arte Moderna, perante convidados ilustres, os motivos científicos de seu
interesse pelo médium. Apesar disso, Arigó acabou sendo preso e só foi
libertado por uma decisão do Supremo Tribunal, ante o prestígio dos nomes dos
cientistas, pertencentes a famosas Universidades dos Estados Unidos, cujos
pareceres foram divulgados nos Diários Associados e em todo o
Brasil. Mas isso não impediu que o Padre Quevedo prosseguisse com suas arruaças
contra o médium e o Espiritismo,
no bom estilo de toureiro que, de capa e espada, desafiava as aspas da verdade
na imprensa e na televisão com rendosa propaganda gratuita dos seus cursos de
pseudoparapsicologia made in Madri.
A moda pegou e o Brasil se encheu de pseudoparapsicólogos
que brotavam do chão como as heresias no tempo de Tertuliano.
Ainda hoje continua a floração desses cogumelos por todo o país. Cursos e
escolas semeiam diplomas da Ciência de Rhine e McDougal à
margem da lei e das áreas educacionais oficialmente autorizadas. Esse
panorama surrealista é responsável pelo atraso em que nos defrontamos no campo
dos estudos e das pesquisas dos fenómenos paranormais no Brasil. O Instituto
Paulista de Parapsicologia, fundado por Cientistas, Médicos, Psicólogos,
estudantes de Medicina (actualmente já médicos famosos) não vingou, ante a
avalanche de aproveitadores que o invadiram, levando os seus directores a
fechá-lo, por esse motivo e pelo total desinteresse das nossas Universidades,
temerosas do pandemónio que se avolumava. Tivemos de voltar à estaca-zero.
Ninguém, nem mesmo os governos, tiveram coragem de pôr a mão na cumbuca,
proporcionando recursos ao Instituto para a montagem do seu laboratório. Nas
vésperas da Era Cósmica, preferimos o gesto cómico,
supinamente burlesco, de lavar as mãos na bacia de Pilatos e deixar o problema
no campo da charlatanice.
/…
José Herculano Pires, Ciência Espírita e
suas implicações terapêuticas – Desenvolvimento da Ciência Espírita, 1 de
2, 4º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: O peregrino sobre o mar
de névoa, por Caspar David
Friedrich)
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