(in Discussão em torno dos fenómenos de materialização)
Na sábia e conscienciosa obra que Alexandre Aksakof consagrou
à refutação das teorias do filósofo Hartmann,
depara-se-nos a seguinte conclusão:
“Tendo adquirido por laboriosa senda a convicção de que o
princípio individual sobrevive à dissolução do corpo e pode, sob certas
condições, manifestar-se de novo por intermédio de um corpo humano, acessível a
influências desse género, a prova absoluta da identidade do indivíduo
resulta impossível.”
Rendemos sincera admiração e profundo respeito ao sábio
russo que revelou, na sua obra, espírito tão sagaz, quanto penetrante. O
seu livro é uma das mais preciosas colectâneas de fenómenos bem estudados, onde
os espíritas encontram armas decisivas para sustentar a luta contra os seus
adversários. Mas, não podemos adoptar todas as suas ideias, por
se nos afigurar que o seu propósito, de se manter estritamente nos limites que
lhe eram impostos na sua discussão com Hartmann,
o fez restringir demasiadamente o carácter de certeza que ressalta da
experimentação espírita. Não haverá contradição entre a primeira e a
segunda parte da citação acima? Como se pode adquirir “a convicção de que o
princípio individual sobrevive”, se não se pode estabelecer a identidade
dos seres que se manifestam? Concluindo-se que, colectivamente, todos os
humanos sobrevivem, será impossível ter-se particular certeza, em relação a um
deles? Examinemos os argumentos em que se baseou o Sr. Aksakof para
chegar àquela desoladora conclusão.
Segundo o autor, (i) a presença de uma
forma materializada, comprovada pela fotografia, ou nas sessões de materialização, não bastaria para lhe atestar a identidade,
como, aliás, também não bastaria o conteúdo intelectual das comunicações. Eis
porquê:
“Não me resta mais do que formular o último desideratum,
relativamente à prova de identidade fornecida pela materialização, e é que essa prova – do mesmo modo que o
exigimos no tocante às comunicações intelectuais e à fotografia transcendental
– seja dada na ausência de qualquer pessoa que possa reconhecer a
figura materializada. Creio que se poderiam encontrar muitos exemplos desse
género nos anais das materializações. Mas, a questão é esta: dado o facto,
poderia ele servir de prova absoluta? Evidentemente, não, porque, admitindo que
um Espírito se pode manifestar dessa maneira, possível lhe é, e o ipso, prevalecer-se dos atributos de personalidade
doutro Espírito e personificá-lo na ausência de quem quer que seja capaz de
reconhecê-lo. Tal mascarada seria completamente insípida, visto que
absolutamente nenhuma razão de ser teria. Do ponto de vista, porém, da
crítica, não poderia ser ilógica a sua possibilidade.”
Parece que Alexandre
Aksakof admite como demonstrado que um Espírito pode mostrar-se sob
qualquer forma, que lhe apeteça tomar, a fim de representar a sua própria
personagem. Ora, isso é o que justamente seria necessário firmar,
por meio de factos numerosos e precisos. Se consultarmos os
milhões de casos em que o Espírito de um vivo se tornou visível, verificaremos
que o duplo é sempre a reprodução rigorosamente fiel do corpo, atingindo essa
identidade todas as partes do seu organismo, como o prova irrefutavelmente a
modelagem do pé fluídico de William
Eglinton, do qual falamos no capítulo anterior. (ii)
– Quando o duplo inteiro de Eglinton se materializa, assemelha-se a tal ponto ao seu corpo físico,
que é necessário ver-se o médium adormecido na sua cadeira, para se ficar
convencido de que ele não está no lugar onde se encontra a aparição. – Quando
a Sra. Fay se mostra entre as duas metades da cortina, com as suas vestes e o
seu rosto, perfeitamente semelhantes aos do seu corpo físico, com os mesmos
traços fisionómicos, cor dos olhos, do cabelo, da pele, torna-se necessário que
a corrente eléctrica lhe atravesse o organismo carnal, para se ter a certeza de
não ser este o que se está a ver.
“Vi – diz o Sr. Brackett, (iii) experimentador
muito céptico e muito prudente –, centenas de formas materializadas e, em muitos casos, o duplo fluídico do
médium assemelhando-se-lhe tanto, que eu teria jurado ser o próprio médium, se não visse o mesmo duplo
desmaterializar-se diante de mim e não houvesse, logo após, comprovado que o
médium se conservava adormecido.”
Não acreditamos que possa alguém citar um único exemplo
de haver um duplo de vivo mudado o seu tipo, exclusivamente por vontade
própria. Ao contrário, da observação das aparições espontâneas, tanto
quanto das obtidas pela experiência, resulta que, se nenhuma influência
exterior for exercida, o Espírito se mostra sempre sob a forma corpórea que lhe
caracteriza a personalidade. Dar-se-à tenha ele, depois da morte, um poder que
lhe faltava em vida? Poderia o Espírito dar ao seu corpo espiritual forma
idêntica à de outro Espírito, de maneira a ser o sósia deste? É o que vamos
examinar.
À primeira vista, parece que o fenómeno da transfiguração
confirma a opinião de que o Espírito pode mudar de forma. Mas, será mesmo
assim? Na realidade, o paciente é inteiramente passivo. Não é, pois,
consciente ou voluntariamente que modifica o seu próprio aspecto. Ele
sofre uma influência estranha, que substitui pela sua aparência a do médium, pois que, geralmente, este não conhece o Espírito
que sobre ele actua. Não se pode, portanto, pretender que o
Espírito de um médium seja capaz – e o ipso – de se transformar. Em nenhum
caso foi isso ainda demonstrado e a substituição de forma bem se pode atribuir
a outro Espírito, visto que, quando o desdobramento se produz de modo
espontâneo, a forma do Espírito é sempre a do corpo.
Estudemos agora os casos em que a aparição é manifestamente
diferente do médium e do seu duplo.
Porventura já se comprovou que um Espírito, tendo-se
mostrado sob uma forma bem definida, tenha mudado de aspecto diante dos
espectadores, assumindo outra inteiramente diversa da primeira? Jamais
semelhante fenómeno se produziu. A única observação, do nosso
conhecimento, que tem alguma relação com este assunto, é a que relata o Sr.
Donald Mac Nab, que conseguiu fotografar e tocar, com os seus seis amigos,
a materialização de uma rapariga que reproduziu
absolutamente um velho desenho datando de vários séculos, desenho que muito
impressionara o médium. Nada, porém, prova, nesse exemplo, que essa
aparição não seja a da moça representada no desenho, tendo bastado
perfeitamente, para atraí-la, o pensamento simpático do médium. Não
está, pois, de modo algum estabelecido que seja essa uma transformação do duplo
do médium, nem tampouco uma criação fluídica objectivada pelo seu cérebro. O
que algumas vezes se tem verificado são modificações na forma, na coloração do
semblante, na expressão da fisionomia da aparição. Pode variar muito o
grau da sua materialidade e, sendo esta fraca, não acentuar bastante os
detalhes da semelhança; mas, o tipo geral não muda. As modificações
são as de um mesmo modelo e não chegam para representar outro ser.
Tomemos o exemplo de Katie King. Indubitavelmente, ela não era um desdobramento
de Florence Cook, porquanto esta, acordada, conversa durante
alguns minutos com Katie e o Sr. Crookes, que as vê a ambas. A independência
intelectual do Espírito materializado revela-se aí com toda a clareza, nada
tendo de duvidoso com relação ao corpo físico, visto que o Sr. Crookes
assinalou as diferenças de forma, de tez, de cabeleira e, o que é mais
importante, dos caracteres fisiológicos entre as duas.
“Uma noite, contei as pulsações de Katie. O seu pulso batia regularmente 75 batidas, ao passo
que o da Srta. Cook,
poucos instantes depois, chegava às 90. Colando o ouvido no peito de
Katie, ouvi-lhe o coração bater dentro e os seus batimentos ainda eram mais
regulares do que os do coração da Srta. Cook, quando, após a sessão, ela me
permitiu a mesma experiência. Auscultados, os pulmões de Katie se revelaram
mais sãos do que os da sua médium que, na ocasião em que fiz a minha experiência,
estava em tratamento médico devido a um forte resfriado.”
Evidentemente, segundo o que se acaba de ler, Katie não era a figura
nem do corpo, nem do duplo do médium. Tinha uma individualidade distinta, se bem que nem
sempre aparecesse completa. Numa sessão com Varley, engenheiro-chefe
das linhas telegráficas da Inglaterra, estando a médium fiscalizada
electricamente, Katie só se mostrou materializada a meio, até à cintura apenas,
faltando ou conservando-se invisível o resto do corpo.
“Apertei a mão àquele ser estranho – diz o célebre
engenheiro – e, ao terminar a sessão, mandou Katie que eu fosse despertar a médium. Encontrei a Srta. Cook em transe, isto é, adormecida, como eu a
deixara, e intactos todos os fios de platina. Despertei-a.”
Segundo Epes
Sargent, nos primeiros tempos, apenas se via o rosto; não havia cabelos,
nem coisa alguma acima da fronte. Parecia uma máscara animada. Após
cinco ou seis meses de sessões, apareceu em forma completa. Esses seres então
se condensam mais facilmente e mudam de cabelos, de vestuário, de cor da tez, à
vontade. Mas, note-se bem que é sempre o mesmo tipo, nunca uma outra
forma.
Neste ponto, torna-se necessário precisemos bastante o que
entendemos pelo termo tipo. Quando se comparam fotografias de um indivíduo,
tiradas em diversas épocas de sua vida, reconhecem-se grandes diferenças entre
as que ele tirou na idade de 15 anos e as que o representam aos 30 anos. Tudo
se modificou profundamente. Os cabelos embranqueceram ou rarearam, os traços se
acentuaram ou ampliaram; notam-se rugas onde antes só se via plena
juvenilidade. Entretanto, com um pouco de atenção, se chega a perceber que
essas divergências não são fundamentais, que se encerram dentro de limites
definidos, dentro do que constitui, durante a vida toda, a característica da
individualidade: o tipo. Podemos perfeitamente conceber que o perispírito seja
capaz de reproduzir uma dessas formas, pois que evolveu através delas neste
mundo. Essa faculdade de fazer que uma imagem reviva de si mesma
assemelha-se a um avivamento de lembranças, o qual evoca uma época passada e a
torna presente para a memória. Nada se perde no envoltório fluídico, as
formas do ser se fixam nele e podem reaparecer sob o influxo da vontade. Isso
se demonstra por meio de alguns exemplos.
Voltemos ao testemunho do Sr. Brackett, citado pelo
Sr. Erny.
“Numa sessão de materialização, vi um rapaz de grande estatura dizer-se
irmão da senhora que me acompanhava e que lhe replicou: “Como poderia eu
reconhecê-lo, se não o vejo desde criança?” Para logo, a figura diminuir de
forma pouco a pouco, até chegar à do menino que a senhora conhecera. Observei
outros casos do mesmo género, acrescenta Brackett.”
Aqui está outro testemunho seu:
“Uma das formas que aparecem em casa da Sra. F... disse ser
Berta, minha sobrinha por afinidade. Como eu me mostrasse duvidoso, a forma
desapareceu e voltou com a voz e a feição de uma criança de quatro anos, idade
em que morrera. Não era um desdobramento, porquanto o médium tem sotaque alemão e Berta não. Quanto ao ser
uma figurante paga pela Sra. F..., desafio seja quem for que se desmaterialize diante de mim, como Berta se
desmaterializou.”
Façamos aqui uma observação importante. Os dois Espíritos
que se reportam à sua meninice têm uma estatura e uma aparência diversas das
que se lhes conheceram neste mundo. Pode admitir-se sejam estatura e
aparência de uma vida anterior à precedente, o que nos conduz à lei geral,
ensinada por Allan
Kardec, de que um Espírito suficientemente adiantado pode assumir,
à sua vontade, qualquer dos tipos pelos quais tenha evolvido no curso de suas
existências sucessivas. Com essa questão, porém, não temos que nos
ocupar, do ponto de vista da identidade, porquanto apenas nos interessa a
última forma, a que conhecemos.
Não se deverá concluir do que fica dito que um Espírito
farsante não possa disfarçar-se, de maneira a simular uma personagem histórica,
mais ou menos fielmente. Claro que a um farsante será possível sempre criar o
redingote cinzento e o chapéu de Napoleão, bem como uma auréola e um par de
asas, a fim de que o tomem por um anjo. Se, porventura, ele tiver uma
vaga parecença com Bonaparte ou com as tradicionais imagens de São José, poderá
enganar os inexperientes, os ingénuos, os desprovidos de senso crítico. Esse
género de embuste pode mesmo ser empregue por Espíritos pouco escrupulosos no
tocante à escolha dos meios para sustentar certas crenças: mas, grande
distância vai dessas caricaturas às experiências cientificamente realizadas,
como as que temos citado neste livro.
Outra observação também muito importante decorre do
estudo das materializações que mostra claramente que não é o
Espírito quem cria a forma sob a qual é ele visto: o facto é que os
moldes são verdadeiros modelos anatómicos.
Os Espíritos que assim se manifestam confessam muito
facilmente que ainda se acham pouco avançados na hierarquia espiritual. Na
maioria dos casos, são limitados os seus conhecimentos e não há suposição
injustificada ao dizer-se que são muito ignorantes em matéria de ciências
naturais. Nessas condições, parece-nos evidente que não poderiam, de modo
algum, construir uma forma suficientemente perfeita para revelar o grau de
realidade que os moldes nos dão a conhecer. As peças modeladas não são
simples esboços mais ou menos bem acabados de um membro qualquer; é da própria
Natureza o que se observa, até nos mínimos detalhes. Temos, pois, a prova de
que é um verdadeiro organismo que se imprime em substâncias plásticas e não
apenas uma imagem, que seria rudimentar, se fosse produzida por um Espírito.
Que organismo então é esse? É o que já existe durante a vida, o que produz
moldagens idênticas no decurso dos desdobramentos; é, numa palavra, o perispírito,
que a morte não destruiu e que persiste com todas as suas virtualidades, pronto
a manifestá-las, desde que seja favorável a ocasião.
Imaginando-se, mesmo, que a forma do nosso corpo está
impressa, como imagem, na nossa memória latente, o que é possível, não
menos verdade é que todos os detalhes anatómicos, saliências das veias, dos
músculos, desenhos da epiderme, etc., não podem existir nessa imagem
mental, pelo menos quanto às partes do corpo que geralmente se conservam
cobertas pelas roupas.
Entretanto, nos desdobramentos materializados de médiuns, sempre que foi possível tomarem-se-lhes impressões
ou moldes, se tem reconhecido que o corpo fluídico assim exteriorizado é a
reprodução idêntica do organismo material do médium, do seu pé, por exemplo,
como foi notado com Eglinton pelo
Dr. Carter Blake, ou de sua mão, conforme aconteceu muitas vezes com Eusápia. É o
critério que nos permitirá distinguir da materialização de um Espírito um
desdobramento. Se a aparição é o sósia do médium, segue-se que a sua alma é que
se manifesta fora do seu organismo carnal. No caso contrário, se a aparição
difere anatomicamente do médium, quem está presente é outra individualidade.
Esta observação, que fomos os primeiros a fazer, permite
se distinga facilmente se o fantasma é a aparição de um ser desencarnado,
ou uma bilocação do médium.
Não será talvez supérfluo insistir fortemente nas numerosas
provas que apoiam a nossa maneira de ver.
O astrónomo alemão Zoellner afirma
que durante uma das suas experiências com Slade, (iv) se
produziu a impressão de uma mão fluídica, num vaso cheio de farinha
finíssima, com todas as sinuosidades da epiderme distintamente visíveis,
não tendo o observador perdido de vista as mãos do médium, que se conservaram sempre sobre a mesa. Aquela mão
era maior do que a de Slade. Doutra feita, produziu-se uma
impressão durável numa folha de papel enfumarado na chama de uma lâmpada de
petróleo. Slade descalçou-se e mostrou que nenhum vestígio havia dos resíduos
da fumaça nos seus pés. A impressão tinha quatro centímetros mais do
que o pé do médium e parecia a de um pé comprimido por uma bota, porquanto um
dos dedos cobria completamente o outro, tornando-o invisível.
O Dr. Wolf, (v) com a médium Sra. Hollis, pode observar uma mão a fazer
evoluções rápidas, pousar sobre um prato cheio de farinha e retirar-se depois
de sacudir as partículas que lhe ficaram aderentes. “A impressão representava a
mão de um homem adulto, com todos os detalhes anatómicos.” Os dedos
marcados na farinha eram mais longos, uma polegada, do que os da Sra. Hollis.
O professor Denton, (vi) inventor do
processo de moldagem na parafina, obteve, na primeira sessão com a Sra. Hardy,
entre quinze a vinte moldes de dedos de todos os tamanhos. Na maioria dessas
formas, notadamente nas maiores ou nas que mais se aproximavam, pelas suas
dimensões, dos dedos do médium, ressaltavam nítidos todas as linhas, sulcos
e relevos que se notam nos dedos humanos. Uma comissão de sete membros
assinou uma acta onde se encontra consignado o seguinte: dentro de uma caixa
fechada, produziu-se, pela acção inteligente de uma força desconhecida, o
molde exacto de uma mão humana de tamanho natural. O escultor O'Brien,
perito em moldagens, examinou sete dos modelos em gesso e os considerou de
maravilhosa execução, reproduzindo todas as particularidades anatómicas,
assim como as desigualdades da pele, com tão grande pormenor, como a que se
obtém na modelagem de um membro, mas com molde constituído de
diferentes pedaços, ao passo que os modelos submetidos ao seu exame não
apresentavam qualquer vestígio de soldadura, parecendo-lhe
resultantes de moldes sem samblagens.
Esse relatório assinala que uma dessas moldagens das mãos
“se assemelha singularmente, na forma e no tamanho”, a uma modelagem da mão de
um Sr. Henri Wilson, examinada por O'Brien, pouco tempo depois da sua morte, de
cujo rosto ele fora fazer a moldagem em gesso. Aí a conservação da forma
fluídica se revela materialmente, constituindo uma boa prova da imortalidade.
Numa sessão em casa do Dr. Nichols, com Eglinton,
através de um molde de mão de criança foi esta reconhecida, graças a uma
ligeira deformidade característica, reproduzida no molde.
O Dr. Nichols reconheceu sem hesitar a mão de sua filha,
obtida pelo mesmo processo.
“Esta mão – diz ele – nada tem da forma convencional que
os estatuários criam. É uma mão absolutamente natural, anatomicamente correcta,
mostrando todos os ossos, todas as veias, todas as menores sinuosidades da
pele. É exactamente a mão que eu conhecia, que eu tão bem conheci durante a sua
existência corporal, que eu tantas vezes toquei, quando se apresentava
materializada.”
Nas experiências dos Srs. Reimers e Oxley, a materialização chamada Bertie deu duas mãos direitas e
três esquerdas – todas em posições diferentes, o que não impediu que as
linhas e os pregueados fossem idênticos em todos os exemplares. As mãos
pertencem indubitavelmente à mesma pessoa. As moldagens das mãos do médium diferem totalmente, quer como forma, quer nas
dimensões, das de Bertie. Com o médium Monck, a mesma Bertie também deu os
moldes de suas duas mãos, os quais são idênticos aos obtidos com a primeira
médium, Sra. Firman, o que estabelece, de modo perfeito, a identidade do
Espírito. O Espírito Lily variava de tamanho; ora a sua estatura não
ultrapassava a de uma criança bem conformada, ora apresentava as dimensões da
de uma rapariga.
“Creio – diz o Sr. Oxley – que ela não apareceu duas vezes
sob formas absolutamente idênticas; eu, porém, a reconhecia sempre e nunca a
confundi com as outras aparições.”
Poderíamos multiplicar estes depoimentos segundo os quais o
Espírito tem um organismo, que ele não forma na ocasião e para os fins da
experiência; vamos, porém, ver outras provas. Sabemos que a aparição de Katie King se assemelha inteiramente a uma pessoa
natural. Temos sobre esse ponto o testemunho formal de William Crookes. Nas materializações completas é o que
sempre se dá. Alfred Russel Wallace, numa carta ao Sr. Erny escreve:
“Algumas vezes, a forma materializada parece uma simples máscara, incapaz de
falar e de se tornar tangível a um ser humano. Noutras circunstâncias, a
forma tem todos os característicos de um corpo vivo e real, podendo
mover-se, falar, mesmo escrever e revelando calor ao tacto. Tem, sobretudo,
individualidade e qualidades físicas e mentais totalmente diversas das do médium.”
Numa sessão em Liverpool, com um médium não profissional, o Sr. Burns viu aproximar-se
de si um Espírito que com ele estivera relacionado durante longo tempo.
“Apertou-me a mão – diz Burns – com tanta força que
ouvi o estalido de uma das articulações dos seus dedos, como só acontece
quando se aperta fortemente uma mão. Esse facto anatómico foi corroborado pela
sensação que eu experimentava de estar segurando uma mão perfeitamente
natural.”
Fazia parte desse círculo de experimentadores o Dr. Hitchman,
autor de várias obras de medicina, o qual, numa carta dirigida ao Sr. Aksakof,
escreveu: (vii)
“Pelo facto, creio ter adquirido a mais científica certeza,
que seja possível obter-se, de que cada uma dessas formas que apareceram era
uma individualidade distinta do envoltório material do médium, porquanto, tendo-as examinado com o auxílio de
diversos instrumentos, comprovei nelas a existência da respiração e da
circulação; medi-lhes a forma, a circunferência do corpo, tomei-lhes o peso,
etc.”
Pensa o autor que esses seres têm uma realidade objectiva,
mas que a aparência corpórea deles é de natureza diferente da “forma material”
que caracteriza a nossa forma terrestre. Depois dessa época, os numerosíssimos
fenómenos de telepatia projectaram luz sobre essas aparições cujos caracteres
pareciam verdadeiramente sobrenaturais, porém que, melhor conhecidos, podem
ser, se não explicados completamente, pelo menos logicamente concebidos.
Reflicta-se por um instante que o duplo de um vivo, logo que
saído do seu corpo, é um Espírito, como o será depois da morte; que as suas
manifestações físicas e intelectuais são idênticas às que um Espírito
desencarnado pode produzir, e ver-se-à que as moldagens constituem prova
absoluta da imortalidade.
Logo, no estado actual dos nossos conhecimentos, cremos
que a identidade de um Espírito se encontra perfeitamente estabelecida quando
ele se mostra a actuar, materializado numa forma idêntica à que teve outrora o
seu corpo físico.
É o caso de Estela Livermore e de muitos outros Espíritos que
foram identificados de modo a não deixar que subsistisse qualquer dúvida.
Examinando minuciosamente, nas obras originais, os factos
mencionados acima e sem formular hipótese, parece-nos que as seguintes
conclusões se impõem logicamente:
1º) que os Espíritos têm um organismo fluídico;
2º) que, quando esse corpo fluídico se materializa,
reproduz fielmente um corpo físico que o Espírito revestiu durante certo
período da sua vida terrestre;
3º) que nenhuma experiência ainda demonstrou que o grau
de variação dessa forma possa ir ao ponto de reproduzir outra forma
inteiramente distinta daquela sob a qual ela se mostra espontaneamente. Se
alguma variação se opera, não passa de uma diferença para mais ou para menos do
mesmo tipo;
4º) que, estabelecido, como se acha, experimentalmente,
pela fotografia, pelas moldagens, pelas mais variadas acções físicas, que
aquele organismo existe nos vivos, pode, por efeito de rigorosa dedução,
afirmar-se a sua existência depois da morte, uma vez que ela se nos impõe pelos
mesmos factos que a têm positivado com relação aos vivos;
5º) logo, até prova em contrário, a aparição de um
Espírito que fala e se desloca no espaço, que se pode reconhecer como sendo uma
pessoa que viveu na Terra é prova excelente de sua identidade.
/...
(i) Animismo e Espiritismo, págs. 622 e seguintes.
(ii) Veja-se, na segunda parte desta obra, Capítulo I, o
tópico “Materialização de um desdobramento”.
(iii) Alfred Erny, O psiquismo experimental, cap. V, Formas
materializadas.
(iv) Zoellner, Wissenschaftliche Abhandlungen, volume II.
(v) Dr. Wolf, Starlings facts, pág. 481.
(vi) The Spiritualist, 1876, t. I, pág. 146.
(vii) Animismo e Espiritismo, pág. 22.
Gabriel Delanne, A Alma é Imortal, Terceira
parte – O Espiritismo e a ciência; Capítulo IV Discussão em torno dos
fenómenos de materialização – Estudo sobre a identidade dos
Espíritos, 17º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: Pitágoras, pormenor
d'A escola de Atenas de Rafael Sanzio (1509)