CAPÍTULO I
Fundamentos científicos da concepção neo-espírita da vida e da história ~
Que somos? (VI)
Os casos de dupla personalidade ou alotrópicos,
dos quais temos feito menção, oferecem ao psicólogo livre de preconceitos
elementos de reflexão e conduzem logicamente a buscar no perispírito a
explicação científica dos ditos fenómenos, encontrando-se estes na função de
mediadores plásticos e estruturais das formas específicas e da personalidade
característica de cada ser, o receptáculo ou arquivo da memória
subconsciente, onde o espírito regista e conserva indelevelmente a memória
integral do seu passado e dos conhecimentos adquiridos por meio das mudanças de
personalidade durante as suas múltiplas existências.
Tem-se pretendido explicar os fenómenos de dupla
personalidade, como já dissemos, pela hipótese da dualidade cerebral, hipótese
pouco feliz e que não prosperou, porque os factos, muitos deles, pelo menos, se
encarregaram de destruí-la, como veremos mais adiante.
Quis explicar-se também esses fenómenos considerando-os como
simples casos de amnésia, quando, a rigor, se trata de fenómenos de
criptomnésia – de uma categoria superior aos classificados por este nome pelo
professor Charles
Richet – de uma criptomnésia ou memória oculta em que as
lembranças arquivadas na subconsciência (conceito espírita) afloram à
consciência e se alternam periodicamente na memória ordinária.
Na linguagem empírico-psicológica: um sujeito que se
desdobra é um “psicopata”, um doente, amiúde, um histérico. A histeria o
elucida, ainda que para isso tivesse que começar dando a estes uma explicação
verdadeiramente científica, de que carecem; pois não é possível explicar um
fenómeno desconhecido por outro de origem também desconhecida.
Esta última explicação é também aquela que alguns psiquiatras
dão aos fenómenos metapsíquicos ou
espíritas em geral, os quais, diga-se, escapam ao domínio da sua especialidade
por mais que a ignorância dos profanos pretenda erigi-los em autoridades nesta
matéria, sem que a tenham estudado e aprofundado, como disciplina científica,
ainda que até certo ponto tenham relação com a ciência de sua especialidade.
Todas as pessoas ilustradas nesta matéria sabem que quando
os médicos psiquiatras quiseram explicar os fenómenos metapsíquicos ou
espíritas pela psicopatologia, fracassaram irremediavelmente.
Se os estados patológicos fossem capazes de produzir
fenómenos tão maravilhosos como os enunciados, declarar-se-ia que a
enfermidade, em tais casos, é superior à saúde e que o anormal (psíquica e
mentalmente considerado) é mais normal, tem mais ciência e mais
consciência que o supranormal e em tal caso ter-se-ia que eliminar a acção
terapêutica da medicina psiquiátrica, por considerá-la contrária às
manifestações de ordem psíquico-superior e às investigações da ciência
metapsíquica e espírita.
Não há que se estranhar a atitude avessa com que certos
cientistas tratam os fenómenos do Espiritismo, fazendo-os passar por produto da
psicose ou morbidez dos médiuns.
Acaso não há aqueles que afirmam temporariamente que a
tuberculose e a tísica aguçam a inteligência e desenvolvem a sensibilidade
artística, que o talento e o génio são derivados do artritismo, ou afirmam,
seguindo as elucubrações pseudo-científicas do doutor Chabaniex, que a
“auto-intoxicação” e a enfermidade são um “fermento de criação” inteligente,
quando não são em si mesmas uma verdadeira criação e chegam ao cúmulo da
temeridade científica afirmando com o doutor Pascal Perp e os seus seguidores
que a causa produtora do génio é a “sífilis hereditária”?
Certo é que o eminente psiquiatra Lombroso não mais
sustentasse nos seus últimos anos, depois das suas célebres experiências no
fenomenismo espírita, a teoria anti-científica que confunde o génio com a
loucura, nem houvesse escrito as páginas (das quais teve que se
envergonhar mais tarde) nas quais colocava os médiuns e os espíritas na
categoria de loucos e anormais; e é certo também que o nosso sábio Ingenieros, tendo
vivido alguns anos mais (já engajado na corrente metapsíquica), se arrependeu
de ter estabelecido uma triste semelhança entre a loucura genial de Nietzsche e a loucura
genial de Jesus, nem tivesse sustentado a afirmação
positivo-materialista de que já “não há alma”, considerada como uma entidade
“real ou espiritual”, que a alma é uma função-adjunta no curso
da evolução biológica.
/…
Manuel S. Porteiro (i), Espiritismo
Dialéctico, CAPÍTULO I Fundamentos científicos da concepção neo-espírita da
vida e da história – Que somos? (VI), 6º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: Personajes, Pintura
de Josefina
Robirosa)
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