Nas
Almas evolvidas, o sentimento da solidariedade torna-se bastante
intenso para se transformar em comunhão perpétua com todos os seres e com Deus.
A Alma pura
comunga com a Natureza inteira; inebria-se nos esplendores da Criação infinita.
Tudo – os astros do céu, as flores do prado, a canção do regato, a variedade
das paisagens terrestres, os horizontes fugitivos do mar, a serenidade dos
espaços – tudo lhe fala uma linguagem harmoniosa. Em todas essas coisas
visíveis, a Alma atenta descobre a manifestação do pensamento invisível que
cobre o Cosmos. Este reveste para ela um aspecto encantador. Torna-se o teatro
da vida e da comunhão universais, comunhão dos seres uns com os outros e de
todos os seres com Deus, seu pai.
Não há
distância entre as Almas que se amam, porque se comunicam através da extensão.
O Universo
é animado de vida potente: vibra qual uma harpa sob a acção divina. As
irradiações do pensamento o percorrem em todos os sentidos e transmitem
mensagens de Espírito a Espírito, através do Espaço. Esse Universo que Deus
povoou de Inteligências, a fim de que o conheçam e o amem e cumpram a sua Lei,
Ele o enche de sua presença, ilumina-o com a sua luz, aquece-o com o seu amor.
A prece é a
expressão mais alta dessa comunhão das Almas. Considerada sob este aspecto, ela
perde toda a analogia com as fórmulas banais, os recitativos monótonos em uso,
para se tornar um transporte do coração, um acto da vontade, pelo qual o
Espírito se desliga das servidões da Matéria, das vulgaridades terrestres, para
perscrutar as leis, os mistérios do poder infinito e a ele submeter-se em todas
as coisas: “Pedi e recebereis!” Tomada neste sentido, a prece é o acto
mais importante da vida; é a aspiração ardente do ser humano que sente a sua
pequenez e a sua miséria e procura, pelo menos por um instante, pôr as
vibrações do seu pensamento em harmonia com a sinfonia eterna. É a obra da
meditação que, no recolhimento e no silêncio, eleva a Alma até essas alturas
celestes, onde aumenta as suas forças, onde a impregna das irradiações da luz e
do amor divinos. Mas quão poucos sabem orar! As religiões nos fizeram
desaprender a prece, transformando-a em exercício ocioso, às vezes ridículo.
Sob a
influência do Novo Espiritualismo, a prece tornar-se-á mais nobre e mais digna;
será feita com mais respeito ao Poder Supremo, com maior fé, confiança e
sinceridade, em completo destaque das coisas materiais. Todas as nossas
ansiedades e incertezas cessarão quando tivermos compreendido que a vida é a
comunhão universal e que Deus e todos os seus filhos vivem, em conjunto, essa
vida.
Então, a
prece tornar-se-á a linguagem de todos, a irradiação da Alma que, nos seus
transportes, agita o dinamismo espiritual e divino. Os seus benefícios se
estenderão por todos os seres e particularmente por aqueles que sofrem, pelos
ignorados da Terra e do Espaço.
Ela chegará
àqueles em quem ninguém pensa, que jazem na sombra, na tristeza e no
esquecimento, diante de um passado acusador. Ela originará neles inspirações
novas, fortificar-lhes-á o coração e o pensamento – porque não tem limites a
acção da prece, assim como as forças e os poderes que ela pode pôr em
elaboração para o bem dos outros.
A prece, em
verdade, nada pode mudar às leis imutáveis; ela não poderia, de maneira alguma,
mudar os nossos destinos; o seu papel é proporcionar-nos socorros e luzes que
nos tornem mais fácil o cumprimento da nossa tarefa terrestre. A prece fervente
abre, de par em par, as portas da Alma e, por essas aberturas, os raios de
força, as irradiações do foco eterno nos penetram e nos vivificam.
Trabalhar
com sentimento elevado, visando a um fim útil e generoso é, ainda, orar. O
trabalho é a prece activa desses milhões de homens que lutam e penam na Terra,
em benefício da Humanidade.
A vida do
homem de bem é uma prece contínua, uma comunhão perpétua com os seus semelhantes
e com Deus. Ele já não tem necessidade de palavras, nem de formas exteriores
para exprimir a sua fé: ela se exprime por todos os seus actos e por todos os
seus pensamentos. Ele respira e se agita sem esforço numa atmosfera fluídica
cheia de ternura pelos desgraçados, cheia de boa-vontade por toda a Humanidade.
Essa comunhão constante se torna uma necessidade, uma segunda natureza. É
graças a ela que todos os Espíritos de eleição se mantêm nas alturas sublimes
da inspiração e do génio.
Os que
vivem no organismo e na materialidade e, cuja compreensão não está aberta às
influências do Alto, esses não podem saber que impressões inefáveis faculta
essa comunhão da Alma com o Espírito Divino.
Todos
aqueles que, vendo a espécie humana deslizar sobre os declives da decadência
moral, procuram os meios de sustar a sua queda, devem esforçar-se por tornar uma
realidade essa união estreita de nossas vontades com a vontade suprema! Não há
ascensão possível, encaminhamento para o Bem, se, de tempos a tempos, o homem
não se volta para o seu Criador e Pai, a fim de lhe expor as suas fraquezas, as
suas incertezas, as suas misérias, para lhe pedir os socorros espirituais
indispensáveis à sua elevação. E quanto mais essa confissão, essa comunhão
íntima com Deus for frequente, sincera, profunda, mais a Alma se purifica e emenda.
Sob o olhar de Deus, ela examina, expande as suas intenções, os seus
sentimentos, os seus desejos; passa em revista todos os seus actos e, com essa
intuição, que lhe vem do Alto, julga o que é bom ou mau, o que deve destruir ou
cultivar. Ela compreende, então, que tudo quanto há de mal vem do eu e
deve ser abatido para dar lugar à abnegação, ao altruísmo; que, no sacrifício
de si mesmo, o ser encontra o mais poderoso meio de elevação, porque, quanto
mais ele se dá, mais se engrandece. Deste sacrifício faz a lei de sua vida, lei
que imprime no mais profundo do seu ser, em traços de luz, a fim de que todas
as acções sejam marcadas com o seu cunho.
De pé sobre
a Terra, meu sustentáculo, minha nutriz e minha mãe, elevo os meus olhares para o
Infinito, sinto-me envolvido na imensa comunhão da vida; os eflúvios da Alma
universal me penetram e fazem vibrar o meu pensamento e o meu coração; forças
poderosas me sustentam, aviventam em mim a existência. Por toda a parte onde a
minha vista se estende, por toda a parte a que a minha inteligência se
transporta, vejo, discirno, contemplo a grande harmonia que rege os seres e,
por vias diversas, os faz rumar para um fim único e sublime. Por toda a parte
vejo irradiar a Bondade, o Amor, a Justiça!
Ó meu Deus!
Ó meu Pai! Fonte de toda a sabedoria, de todo o amor, Espírito Supremo cujo
nome é Luz, eu te ofereço os meus louvores e as minhas aspirações! Que elas
subam a ti, qual um perfume de flores, qual sobem para o céu os odores
inebriantes dos bosques. Ajuda-me a avançar na senda sagrada do conhecimento,
para uma compreensão mais alta das tuas leis, a fim de que se desenvolva em mim
mais simpatia, mais amor pela grande família humana; pois sei que, pelo meu
aperfeiçoamento moral, pela realização, pela aplicação activa em torno de mim e
em proveito de todos, da caridade e da bondade, aproximar-me-ei de ti e,
merecerei conhecer-te melhor, comungar mais intimamente contigo na grande
harmonia dos seres e das coisas. Ajuda-me a desprender-me da vida material, a
compreender, a sentir o que é a vida superior, a vida infinita. Dissipa a
obscuridade que me envolve; depõe na minha alma uma centelha desse fogo divino
que aquece e abrasa os Espíritos das esferas celestes. Que a tua doce luz e,
com ela, os sentimentos de concórdia e de paz se derramem sobre todos os seres!
/…
Léon Denis, O Grande Enigma, Primeira parte / Deus e o Universo, III Solidariedade
| comunhão universal (3 de 3), 13º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: La Madonna de Port
Lligat, detalhe | 1950, Salvador
Dali)
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