sexta-feira, 29 de março de 2019

O peregrino sobre o mar de névoa ~

Natureza Moral da Terapia Espírita (II)

Há pessoas que usam a terapia espírita como autógena (i), entregando-se à prece, sem procurar o socorro de médiuns.

Esse é um aspecto pouco conhecido da terapia espírita.

As pessoas que recorrem a esse processo não o fazem por auto-suficiência, mas por estarem submetidas a viciações ou perversões de que se envergonham.

Conhecemos casos de homossexualidade masculina e feminina que foram assim auto-curados. Não se trata propriamente de uma auto-cura, pois a terapia espírita foi realizada pelos espíritos e não por elas mesmas. Essas vítimas, conhecendo a doutrina, cultivaram a fé racional e conseguiram impor a si mesmas disciplinas curadoras a que se apegaram com firmeza e constância.

Os que perseveram nas suas boas intenções criam condições favoráveis à acção curadora dos espíritos terapeutas.

É emocionante o caso de um rapaz de família exemplar que esteve à beira do suicídio.

Foi salvo por uma voz que lhe soou na mente dizendo:

“Deus me permitiu anunciar-te a hora da libertação. Daqui por diante não sentirás mais os impulsos negativos que te torturavam. Esgotaste perante a Espiritualidade Superior um passado de ignomínias (i).”

Não foi um caso de auto-sugestão, mas de perseverança na prova, como depois lhe explicou a entidade protectora que lhe falara em particular, dizendo então pela boca de um médium que não o conhecia e nada sabia do seu sofrimento oculto.

Nos casos como estes revela-se a importância da vontade do paciente, como acontece na terapêutica em geral. Numa batalha oculta como a deste jovem intervêm influências de entidades vingativas, que podem levá-lo ao desespero, mas, em contrapartida, há sempre assistência de espíritos amigos, cuja acção se torna mais poderosa quando o paciente desperta as suas potencialidades volitivas e decide o seu destino por si mesmo. Firmado no seu direito de escolha e amparado pelas energias da vontade e os estímulos da consciência de sua dignidade humana, o espírito pode superar as provas mais desesperantes e triunfar sobre as suas tendências inferiores provenientes do submundo da animalidade. Por isso a terapêutica espírita condena e repele a capitulação actual da psiquiatria da libertinagem.

A condenação hipócrita do sexo pelas religiões cristãs sobrecarregou de preceitos e ordenações morais que fomentaram por toda a parte o fingimento e a hipocrisia. As tentativas cruéis de abafar o instinto sexual através de um moralismo ilógico, como o da era vitoriana na Inglaterra, prepararam a explosão sexualista da actualidade, com o rompimento explosivo dos diques e açudes tradicionais. Todos os moralistas condenaram veementemente o pan-sexualismo de Freud, como se ele tivesse culpa de só encontrar, nos traumatismos espantosos do consultório, a violência da libido, dominadora oculta de uma civilização em ruínas. A loucura de Hitler e dos seus comparsas recalcados e homossexuais, bem como a megalomania ridícula e exibicionista de Mussolini, não surgiram das heranças bárbaras, mas do pietismo castrador do medievalismo. O histerismo nazi, ligando-se ao exibicionismo fascista e à necrofilia nipónica, resultaram na formação do Eixo e na explosão da Segunda Conflagração Mundial. Foi uma explosão de recalques. Até mesmo os signos sexuais estavam presentes no sigma nazi, no fascio de Mussolini e no sol nascente de Hiroíto. Veio depois, confirmando esse conluio libidinoso, em que floresceu desavergonhado o homossexualismo germânico. Era evidente que viria depois a era pornográfica em que nos encontramos. Marcuse diagnosticou o mal da civilização, mas não foi capaz de lhe propor a solução conveniente, que aos poucos se vai delineando numa volta penosa ao reconhecimento da naturalidade do sexo, sem os excessos e desmandos da actualidade, em que a contribuição russa aparece com a mística libidinosa de Rasputin.

Historicamente, pesa sobre a figura angustiada de Paulo de Tarso a responsabilidade dessa tragédia mundial. Porque foi ele, o Apóstolo dos Gentios, quem implantou nas comunidades nascentes do Cristianismo Primitivo as leis de pureza do Judaísmo farisaico, tantas vezes condenadas por Cristo. O seu zelo pelo Cristianismo chegou ao excesso de deformá-lo, na luta que teve de enfrentar com a libertinagem do paganismo. Armou a dialéctica histórica da tese pagã contra a antítese cristã-judaica, que resultou na síntese da hipocrisia clerical. Aldous Huxley colocou este problema nos seus livros Os Demónios de Loudan e O Génio e a Deusa.

Kardec já havia antecipado, nos meados do século passado, as convulsões morais que abalariam o mundo a partir da Guerra do Piemonte. Previu a sucessão de guerras e revoluções que se desencadeariam, com surpreendentes transformações sociais, políticas e culturais em todo o mundo, acentuando que não eram catástrofes geológicas, que aconteceriam naturalmente, como sempre acontecem, mas catástrofes morais que abalariam as nações aparentemente mais seguras nas suas tradições. E o remédio indicado para a reconstrução do mundo seria a educação das novas gerações, nos princípios de liberdade, igualdade e fraternidade, o lema da Revolução Francesa que ressurgiria com o restabelecimento ou a ressurreição do Cristianismo de Cristo e não dos seus vigários, como anunciaria também o Padre Alta (*), Doutor da Sorbonne, suspenso das ordens pelas suas ideias perigosas.

/…
(*) Também, (CEFi, Centro de Estudos de Filosofia, José Eduardo Franco / Padre Sena Freitas / John Lancaster Spalding). Nota desta publicação.

José Herculano Pires, Ciência Espírita e suas implicações terapêuticas, 3 Natureza Moral da Terapia Espírita 2 de 3, 9º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: O peregrino sobre o mar de névoa, por Caspar David Friedrich)
(BrucknerSinfonia n. 3 (versão 1889), hr-Sinfonieorchester / Frankfurt Radio Symphony Orchestra, sobre a direcção de Paavo Järvi / Wiesbaden, Kurhaus 2013)

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