Unidade substancial do Universo
(II)
A grande querela secular que dividia as escolas filosóficas reduz-se, pois, a
uma questão de palavras. Nas experiências em que a William
Crookes coube tomar a iniciativa, a matéria funde-se, o átomo
desaparece; em seu lugar surge a energia. A substância é um Protão que reveste
mil formas inesperadas. Os gases, que se consideravam permanentes, se
liquefazem; o ar se decompõe em elementos muito mais numerosos do que a ciência
de ontem ensinava; a radioactividade, isto é, a aptidão dos corpos à
desagregação, emitindo eflúvios análogos aos raios catódicos, revela-se qual um
facto universal. Uma revolução se dá nos domínios da Física e da Química. Por
toda a parte, à nossa volta, vemos expandirem-se fontes de energia, imensos
reservatórios de forças, muito superiores em potência a tudo quanto até hoje se
conhecia. A Ciência se encaminha, pouco a pouco, para a grande síntese
unitária, que é a lei fundamental da Natureza. As suas mais recentes descobertas
têm um alcance incalculável, no sentido de demonstrar, experimentalmente, o
grande princípio constitutivo do Universo: unidade das forças, unidade das
leis. O encadeamento prodigioso das forças e dos seres – precisa-se,
completa-se. Verifica-se existir continuidade absoluta, não só entre todos os
estados da Matéria, mas ainda entre estes e os diferentes estados da
força. (*)
A energia parece ser a substância única, universal. No
estado compacto, ela reveste as aparências a que chamamos matéria
sólida, líquida, gasosa; sob um modo mais subtil,
constitui os fenómenos de luz, calor, electricidade, magnetismo, afinidade
química. Estudando a acção da vontade sobre os eflúvios e as irradiações,
poderíamos, talvez, entrever o ponto, o vértice em que a força se torna
inteligente, em que a Lei se manifesta, em que o Pensamento se transforma em
vida. (**)
E isso porque tudo se liga e encadeia no Universo. Tudo é
regulado pela lei do número, da medida, da harmonia. As manifestações mais
elevadas de energia confinam com a inteligência. A força se transforma em
atracção; a atracção se faz amor. Tudo se resume num poder único e primordial,
motor eterno e universal, ao qual se dão nomes diversos e é apenas o
Pensamento, a Vontade divina. As suas vibrações animam o Infinito! Todos os
seres, todos os mundos se banham no oceano das irradiações que emanam do
inesgotável foco.
Consciente da sua ignorância e da sua fraqueza, o homem fica
confundido diante dessa unidade formidável que abrange todas as coisas e com
ela conduz a vida das Humanidades. Ao mesmo tempo, entretanto, o estudo do
Universo lhe abre fontes profundas de gozos e de emoções. Apesar da nossa
enfermidade intelectual, o pouco que entrevemos das leis universais nos
arrebatam; na Potência ordenadora das leis e dos mundos pressentimos Deus
e, por isso, adquirimos a certeza de que o Bom, o Belo, a Harmonia perfeita,
reina acima de tudo.
/…
(*) “Os produtos da dissociação dos átomos – diz Gustave Le Bon – constituem uma
substância intermediária, por suas propriedades, entre os corpos ponderáveis e
o éter imponderável, isto é, entre dois mundos profundamente separados até
aqui.” (Revue Scientifique, 17 de Outubro de 1903).
“As observações precedentes – diz ainda esse eminente
químico – parecem provar que os diversos corpos simples derivam de matéria
única. Essa matéria primitiva seria produzida por uma condensação do éter.”
(Revue Scientifique, 24 de Outubro de 1901).
(**) Ver nota complementar nº 2, no fim deste volume.
Léon Denis, O Grande Enigma, Primeira parte Deus e o Universo, II
Unidade substancial do Universo (2 de 2), 10º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: La Madonna de Port
Lligat, detalhe | 1950, Salvador Dali)