a França, a sua missão; a alma Céltica ~
(abril de 1922)
O talento da França é feito de equilíbrio e de harmonia.
Apesar de certas faltas no passado, pode dizer-se que ele muitas vezes serviu
de mediador entre as escolas mais diversas, entre os sistemas mais opostos.
Ainda hoje, na ordem política, por exemplo, a França se mantém entre a reacção
e a anarquia. Foi frequente assim, no decorrer da sua história, nos domínios da
arte e do pensamento.
Vimos que a sua língua, que é uma das expressões do seu talento, apresenta as
qualidades de precisão e de flexibilidade que fazem dela um maravilhoso agente
de difusão e de propaganda. Ela sabe emprestar às ideias, ao mesmo tempo, a
força e a graça e, é por aí que ela pode contribuir largamente para iniciar o
mundo no conhecimento das leis superiores.
A literatura e a poesia francesas, melhor que todas as
outras, souberam reproduzir todas as nuances do pensamento e
do sentimento; a ternura, a energia, o encanto, a doçura infinita do
ideal, numa palavra, todos os sonhos sobre-humanos da arte e da beleza.
O luminoso talento da França tem por papel, principalmente,
reunir e fundir, numa média equilibrada, os dois talentos diferentes, o do Sul
e o do Norte, da raça latina e das raças setentrionais. É, talvez, ao
encontro desses elementos opostos, ao fluxo e refluxo dessas correntes
diferentes, que se deve a mobilidade do seu espírito e a instabilidade por
vezes enfadonha de seus desígnios; porém, sempre após os períodos de
crise, em que o equilíbrio nela é alterado, o espírito nacional retorna a sua
actividade e ao seu progresso.
A sua missão, portanto, parece ser a de fornecer aos outros
povos, de espírito mais lento, as indicações, as directrizes das quais eles
tiram uma aplicação prática e fecunda. É nesse sentido que a França é
um agente maravilhoso de progresso e de evolução humana, pelo seu cuidado com a
verdade e com a luz e, pela beleza das formas com as quais ela se compraz em
revesti-las.
São essas qualidades que lhe darão um papel preponderante
na difusão do Espiritismo filosófico e moral, enquanto que os países
anglo-saxões estão interessados em representá-lo, principalmente sob o seu
aspecto científico e experimental.
Após as suas horas de tentativas e de obscuridade, o génio
da França, que não é outro senão a alma sempre viva e imortal da Gália, se
ergue e, com um vigoroso esforço, se liberta dos atoleiros terrestres e se
lança em direcção ao céu, para ali descobrir novos horizontes, novas
perspectivas sobre o futuro e mostrá-las como objectivo à humanidade em marcha.
Para todos aqueles que sabem estudar e compreender o génio
da nossa raça, sob o véu do cepticismo que por vezes a recobre, a
alma céltica reaparece
e, nas horas solenes, são os seus impulsos que determinam as resoluções viris,
os actos decisivos.
É ela que inspira Jeanne d’Arc e
pelas suas mãos livra a França do jugo dos ingleses; ainda é ela
que provoca essa poderosa explosão espiritualista que, em época revolucionária,
leva a todos a noção essencial de liberdade, assegurando assim o triunfo da
alma moderna sobre as teorias deprimentes do determinismo e do fatalismo. É
sempre ela que, nos dias sombrios de 1914, revela todas as forças vivas da
nação e a conduz, heróica e sublime, diante do despotismo germânico e do
militarismo teutónico (i); mais recentemente ainda, a alma céltica coloca
a nação como um dique em oposição à onda vermelha do bolchevismo (ii).
A França tem maiores deveres que as outras nações, porque
recebeu maiores dons, mais brilhantes qualidades. Assim, as suas
responsabilidades são mais pesadas e mais extensas. Hoje, uma tarefa,
mais importante do que todas as outras, se desenha para ela no mundo inteiro.
Trata-se de iniciar os homens nas belezas de um futuro mais vasto, mais rico
que aquele que as concepções filosóficas e religiosas puderam entrever. Trata-se
de guiar a ascensão humana em direcção ao grau mais elevado do pensamento, onde
se acendem os clarões de um novo dia, a aurora de uma civilização mais nobre e
mais digna, livre dos flagelos que, até aqui, entravaram o caminho áspero e
doloroso da humanidade.
As outras nações têm, cada uma, a sua tarefa importante, mas
a França ultrapassa a todas pela variedade de suas aptidões e de suas
actividades. É por isso que o mundo inteiro tem os olhos postos sobre ela,
esperando o sinal que traçará a sua nova evolução.
Ó alma viva da França, desliga-te das pesadas influências
materiais que ainda te oprimem, eleva-te até esse nobre ideal que é a tua
missão adquirir e propagar no mundo! Somente quando a nova
revelação for conhecida por todos os povos, quando ela tiver dado à sua
expressão a forma magnífica do teu talento, é que os homens compreenderão o seu
grande destino, bem como os deveres e os encargos que ele lhes impõe e, a
justiça e a paz enfim reinarão sobre a Terra regenerada. E por esse
meio o teu papel aparecerá aos olhos de todos. Tu serás respeitada pelas
gerações e, a tua glória se iluminará com um brilho que nada poderá mais
impedir!
/…
(i) Teutónico: relativo aos teutões, povo antigo da
Germânia que habitava as margens do mar Báltico; relativo à Alemanha e aos
alemães. (N.T., segundo o D.K.L.)
(ii) Bolchevismo: doutrina da ala esquerda maioritária do
Partido Operário Social-Democrata Russo; o mesmo que Comunismo. (N.T., segundo
o D.K.L.)
LÉON DENIS, O Espiritismo na Arte, Parte IV
– A França, a sua
missão; A alma céltica, 15º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: Le Livre de la Paix, pintura
de Edgard
Maxence)